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Projeto de Lei antidelação pode afetar casos de Mauro Cid e Ronnie Lessa? Saiba o que dizem especialistas

O objetivo do Centrão é ampliar a influência e se aproximar da gestão das emendas. (Foto: Divulgação)

O PL e o Centrão se uniram pela aprovação, a toque de caixa, de um projeto apresentado em 2016 do então deputado petista Wadih Damous que invalida delações premiadas por réus presos. Caso seja aprovado, parlamentares entendem que o texto poderia beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão.

Na próxima terça-feira, os deputados podem votar um requerimento de urgência da proposta que trata das delações. Essa foi a forma encontrada por apoiadores de Bolsonaro para pular etapas do debate e ressuscitar um texto que estava engavetado há oito anos. Caso seja aprovada, a urgência libera o texto para ser deliberado a qualquer momento.

Há uma dúvida se a aprovação da proposta poderia favorecer os presos Chiquinho e Domingos Brazão, irmãos apontados por Ronnie Lessa, em delação premiada, como mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL).

Quanto ao ex-presidente, o seu ex-ajudante de ordens Mauro Cid revelou em delação que Jair Bolsonaro apresentou aos comandantes das Forças Armadas uma proposta de intervenção militar, em uma tentativa de se manter no poder após derrota nas urnas.

Especialistas criticam o entendimento de alguns parlamentares de que delações já firmadas possam ser afetadas.

“A nova lei processual afeta o processo ou a investigação no estado em que ele se encontra, o que significa dizer que os atos de investigação, os atos probatórios produzidos até então são válidos”, explica André Perecmanis, professor de Direito Penal da PUC-Rio.

Por se tratar de uma norma processual, o entendimento é que sua aplicação se dará sem retroagir para atos realizados sob a vigência da lei anterior. É uma situação diferente de uma mudança penal, que retroage para beneficiar os réus, explica Thiago Bottino, professor de Direito Processual Penal da FGV Rio.

“Quando você tem uma norma penal, ela volta no tempo para beneficiar os indivíduos, por exemplo, em caso de redução de pena ou de crimes que passem a não existir mais. Se você piora a situação do réu, ela não volta no tempo. Mas isso não acontece com a norma processual, que entra em vigor e se aplica dali para frente”, explica Bottino.

A vedação a colaborações de presos passa a valer em casos firmados a partir da aprovação do texto pelo Congresso Nacional, segundo esse entendimento.

“No caso desse projeto de lei em específico, que prevê regras para os acordos de delação, se for aprovado, elas valerão apenas para os próximos”, afirma o especialista.

Para Oscar Vilhena, professor de Direito Constitucional da FGV SP, o projeto pode significar, inclusive, um retrocesso no combate ao crime organizado:

“É preciso destacar que essa lei pode desmantelar um processo que foi muito positivo para o Brasil, sobretudo porque irá beneficiar aqueles que participam de organizações criminosas, incluindo corrupção.”

Projeto antigo

A manobra de Lira e aliados foi revelada pelo colunista Bernardo Mello Franco. Surpreendidos pela movimentação, petistas — que defendiam o mesmo projeto há oito anos —, se dizem constrangidos por ter que se posicionar em assunto resgatado, em tese, para beneficiar o principal nome da oposição.

Em 2016, o então deputado Wadih Damous (PT-RJ), hoje Secretário Nacional de Defesa do Consumidor, apresentou o texto. Sem o apoio do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, o projeto foi rejeitado pela Comissão de Segurança Pública da Casa naquele ano e remetido à CCJ. O texto ficou engavetado até a última semana, quando o deputado Luciano Amaral (PV-AL) solicitou o requerimento de urgência através de um acordo entre os líderes.

Um deputado petista afirma reservadamente que a bancada não terá como votar contra o texto, apesar do entendimento de que Bolsonaro possa ser contemplado pela anulação da delação de Cid. Além de relatar fatos relacionados ao suposto desvio de joias do acervo presidencial e fraudes em cartão de vacina, o militar trata em sua colaboração sobre a existência de um plano de golpe de Estado para impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva.

O parlamentar petista argumenta que seria incoerente esquecer o momento em que Lula e outros aliados estavam sob o cerco de investigações sobre desvios da Petrobras e foram alvos de delatores pela operação. Petistas avaliam ainda que houve, mais uma vez, falta de articulação do governo. As informações são do jornal O Globo.

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