Terça-feira, 15 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 13 de abril de 2025
A versão mais recente do relatório do projeto de lei que anistia os envolvidos nos ataques do 8 de Janeiro de 2023 tem brechas que podem beneficiar o ex-presidente Jair Bolsonaro, de acordo com especialistas em Direito, mas há divergência sobre se pode alcançar a inelegibilidade do ex-presidente, determinada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Bolsonaro está inelegível por ataques ao sistema eleitoral e, em outro processo, é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) sob acusação de liderar uma tentativa de golpe para impedir a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
De acordo com os juristas, o texto atual dá margem para reverter as possíveis condenações futuras contra Bolsonaro que envolvem os questionamentos do resultado das eleições de 2022. Parte deles também vê espaço para reverter a inelegibilidade. O parecer, elaborado pelo deputado Rodrigo Valadares (União-SE), foi protocolado em setembro do ano passado e é até hoje a versão mais recente do texto.
O relatório diz que não só os que participaram dos atos de 8 de Janeiro são anistiados, mas também todos aqueles que o “apoiaram, por quaisquer meios, inclusive contribuições, doações, apoio logístico ou prestação de serviços e publicações em mídias sociais e plataformas”.
O texto diz ainda que “fica também concedida anistia a todos que participaram de eventos subsequentes ou eventos anteriores aos fatos acontecidos em 8 de janeiro de 2023”.
Outro trecho do relatório, redigido para garantir a participação de Bolsonaro nas urnas, diz que “ficam assegurados os direitos políticos, e, ainda, a extinção de todos os efeitos decorrentes das condutas a si imputadas, sejam cíveis ou penais, para as pessoas que se beneficiem da presente lei”.
Bolsonaro tem dito em discursos públicos que o projeto da anistia não é feito para alcançá-lo. No entanto, em entrevista em novembro, o ex-presidente declarou que o Congresso é “o caminho para quase tudo” e que pode recuperar sua elegibilidade por meio do Legislativo. Rodrigo Valadares também tem negado que Bolsonaro seja beneficiado. Ele diz que a anistia ao ex-presidente seria tratada por meio de outro projeto.
Amplitude do texto
Professor da faculdade de Direito da USP e doutor em Direito Constitucional pela mesma instituição, Rubens Beçak avalia, porém, que essa é uma das consequências do texto na redação atual.
— O projeto de anistia do jeito que está proposto tem amplitude suficiente para beneficiar, pela amplitude temporal que coloca, o ex-presidente Bolsonaro. Ele seria beneficiado tanto nos casos em que já foi condenado, ele tem uma inelegibilidade, quanto naqueles que hoje se apresentam, o processo da tentativa de golpe de Estado — afirmou.
O advogado e ex-juiz Marlon Reis, um dos idealizadores da Lei da Ficha Limpa, diz que o “projeto é para beneficiar” o ex-presidente.
— É muito genérico e nem envolve os atos próprios do 8 de Janeiro — apontou.
Especialista em Direito Eleitoral e coordenador do livro “Eleições — O que mudou”, Arthur Rollo também avalia que o projeto favorece o ex-presidente. No entanto, de acordo com o jurista, se aprovado, o texto deveria ser considerado inconstitucional pelo STF.
— Essa possibilidade de anistia é ampla. Pode atingir os processos do Bolsonaro? Pode. Não deve, mas pode. Essa anistia é inconstitucional por implicar em afronta ao Judiciário. Isso é interferência de um Poder sobre o outro — afirma. — Da mesma forma que o Judiciário não pode entrar no mérito de aprovação de uma lei ou não, só pode ver questões formais, também o Congresso não pode entrar no mérito de uma decisão judicial que tem a dosimetria da pena. A pena foi exagerada? Tem que tentar os meios próprios junto ao Supremo.
Já o secretário-geral da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-DF, João Marcos Pedra, diverge sobre a amplitude do texto. Ele diz que o tema não alcança a inelegibilidade de Bolsonaro, ainda que possa beneficiá-lo em outros processos:
— Não vejo possibilidade de brecha que o traga para as eleições de 2026. Podem até conseguir derrubar a condenação dele pelos atos e omissões do 8 de Janeiro. Mas o prontuário de Bolsonaro é mais extenso e tem mais causas de inelegibilidade do que esta.
O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) encabeça uma tentativa de acordo que envolve o Congresso, o Supremo e o Palácio do Planalto para rever a dosimetria das penas de alguns dos condenados pelos atos golpistas. A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, chegou a admitir que o Parlamento poderia discutir institucionalmente com outros Poderes para fazer a revisão de penas, mas ponderou que é contra o projeto de anistia do modo como está colocado. Depois de abordar o assunto, Gleisi modulou o discurso e afirmou que cabe ao STF a revisão.
Bolsonaro disse na semana passada ser contra a construção de uma solução negociada com o STF para reduzir as penas, com análise caso a caso, de alguns dos manifestantes que participaram dos atos golpistas. As informações são do portal O Globo.