A oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quer acelerar a tramitação de um projeto de lei que abre o caminho para a participação de Jair Bolsonaro (PL) na eleição presidencial de 2026. O ex-presidente acumula duas penas de inelegibilidade e não pode concorrer a cargos eletivos até 2030. Um projeto de lei complementar (PLP) de autoria do deputado federal Bibo Nunes (PL-RS) pretende reduzir o período da pena de inelegibilidade de oito para dois anos.
Após críticas ao texto, a bancada do PL quer dissociar a proposta de uma alteração na Lei da Ficha Limpa. Ao portal G1, Bibo Nunes disse que o projeto não modifica a Ficha Limpa, de 2010, e sim a Lei das Inelegibilidades, de 1990. “O meu projeto não altera a Ficha Limpa. Quero deixar claro, não queremos favorecer bandido. O que pune bandido é lei da improbidade administrativa, político corrupto tem que ir para a cadeia”, disse.
A proposta do deputado federal, porém, dá nova redação a um dispositivo da Lei das Inelegibilidades que foi alterado pela Lei da Ficha Limpa. Dessa forma, se aprovado, o projeto de Bibo Nunes, na prática, incide sobre a Ficha Limpa.
O dispositivo em questão é o inciso XIV do artigo 22. A lei de 1990 estipulava uma pena de três anos de inelegibilidade após a realização da eleição que levou à condenação. Esse inciso foi modificado pela Ficha Limpa, que ampliou o período de pena para oito anos. O projeto de Bibo pretende modificar o mesmo inciso, reduzindo o tempo para dois anos.
O idealizador da Lei da Ficha Limpa afirma que o projeto mina a legislação. Ao jornal o Estado de S.Paulo, o advogado e ex-juiz Márlon Reis, conhecido como o “pai” da norma, disse que a proposta encampada pela oposição é uma “afronta escancarada” à Ficha Limpa. O jurista afirmou que a alteração proposta pela bancada do PL é “absurda” por regredir a pena de inelegibilidade a um patamar ainda mais brando do que aquele que vigorava antes da Ficha Limpa ser aprovada.
Segundo a justificativa apresentada por Bibo Nunes, o período de dois anos “é uma sanção mais do que suficiente para os fins que se almeja a inelegibilidade”. Essa avaliação é respaldada pelo próprio presidente da Câmara, Hugo Motta, (Republicanos-PB), que criticou mais de uma vez a punição nesta semana. O deputado classificou a duração da pena como “tempo extenso” e “eternidade”. Além do deputado federal gaúcho, 72 deputados federais assinam a medida como coautores.
A justificativa de Bibo Nunes, respaldada pela presidência da Casa, vai de encontro ao que afirma o idealizador da lei. Márlon Reis explica que o prazo de oito anos visa afastar o político condenado de outras eleições, para além daquela em que foi identificada a conduta de abuso de poder. Com um prazo de dois anos, esse propósito é minado.
“Oito anos significa passar pelo menos três eleições a mais, além daquela (que levou à condenação), sem participar. É um prazo bem razoável. Antes da lei da Ficha limpa, não ficava sem participar nem por uma única. Esse prazo de dois anos é tão absurdo que ele permite, por exemplo, que se participe já da eleição seguinte”, afirmou o advogado.
A Lei da Ficha Limpa originou-se de um projeto de iniciativa popular que contou com mais de 1,6 milhão de assinaturas. A legislação foi redigida por um conjunto de juristas, entre os quais Márlon Reis. Segundo o advogado, o modo como surgiu a legislação é o que a blinda de alterações que pretendem alterá-la, oriundas “dos mais diversos partidos”.
”Tem pessoas nos mais diversos partidos que não gostam da Lei da Ficha Limpa, porque afeta a vida deles, justamente por responderem a processos ou a situações. O risco de se unirem para passar algo assim, para favorecer políticos de um grande número de partidos, é muito alto. Eles só não passarão se a sociedade reagir, como tem feito das outras vezes. O que blinda a Lei da Ficha Limpa é a sua alta aprovação popular, a forma como foi feita”, disse o advogado.
A proposta que reduz o prazo de inelegibilidade está em tramitação na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara, aguardando um parecer do relator Filipe Barros (PL-PR).
(Estadão Conteúdo)