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Projeto reduz indenização por atraso e cancelamento de voos; medida prejudicará passageiros e turistas

Associações de defesa do consumidor afirmam que medida prejudicará passageiros e turistas. (Foto: Reprodução)

Prioridade do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para o segundo semestre, o projeto da nova Lei Geral do Turismo pode reduzir substancialmente as indenizações aos passageiros por atrasos e cancelamentos de voos e impedir que o Código de Defesa do Consumidor seja utilizado nesses processos. São demandas antigas das empresas aéreas, que gastaram R$ 1,1 bilhão ano passado no Brasil para ressarcir clientes. Mas, para o Ministério Público e associações de defesa do consumidor, a modificação prejudicará os passageiros e turistas e pode inclusive piorar a qualidade dos serviços diante da falta de punição.

A mudança na legislação foi proposta pelo relator, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), e aprovada sem alarde pelo Senado Federal. O texto agora volta à Câmara, que o aprovou em 2019 sem as restrições à indenização de passageiros.

O deputado Paulo Azi (União-BA), que assumiu novamente a relatoria do projeto, disse concordar com a alteração. “Quando for efetivamente comprovado que a responsabilidade foi da empresa, ela será penalizada. Quando não foi, não há porque puni-la”, disse. Segundo Azi, a intenção é votar o projeto ainda em agosto e envia-lo para sanção presidencial.

Na avaliação de Flávio Bolsonaro, a regra proposta é uma forma de “conceder segurança jurídica” e “incentivar a resolução de conflitos entre as partes [pela] via administrativa antes de recorrer ao Poder Judiciário, o que custa cerca de R$ 91 bilhões aos cofres públicos”, conforme escreveu em seu parecer. O parlamentar não destacou a mudança em seus discursos sobre o projeto.

O que muda

O texto altera a legislação e jurisprudência atual para reduzir o valor das indenizações. Proíbe que as companhias tenham que pagar danos morais em caráter presumido ou punitivo (ou seja, para que não repitam esses erros) e só permite a indenização com “o objetivo de compensar um dano comprovado”. Hoje, a prática no Judiciário é que as empresas sejam punidas em valores mais altos dos que o dano comprovado, como a perda de um show ou dia de serviço, para que evitem repetir a falha – o caráter “pedagógico” da punição.

Para o diretor de relações institucionais do Instituto de Defesa de Consumidores (Idec), Igor Britto, o projeto “está exclusivamente” voltado a proteger as empresas das “corretas condenações na Justiça”. Presidente da Associação Nacional do Ministério Público do Consumidor (MPCON), o promotor Luiz Eduardo Lemos de Almeida afirma ainda que isso pode piorar a qualidade do serviço.

Além disso, segundo Almeida, a nova redação impedirá que o Ministério Público atue de maneira coletiva para reparar um dano causado, por exemplo, com o cancelamento de uma rota aérea após vendidas as passagens. “Se a companhia resolve suspender a operação daquele trecho, ela seria condenada apenas a restituir o dano material. E, no caso do dano moral, apenas se ele for comprovado e a título contestatório. Não poderia o Ministério Público pedir dano moral coletivo e com aspecto punitivo com relação a essa conduta abusiva.”

Outra alteração que ocorrerá caso o projeto de lei seja aprovado pela Câmara é determinar que, nos voos internacionais, serão utilizadas as regras da Convenção de Montreal para serviços aéreos, que restringe mais os direitos dos passageiros do que a legislação brasileira. Uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) já estabeleceu que danos materiais causados por atrasos e cancelamentos nos voos ou problemas com bagagens são regidos por este tratado internacional, o que limitou o valor da indenização a R$ 7,5 mil.

Mas essa decisão do STF ainda permite que os danos morais (que abalam o lado psicológico, como desgosto, humilhação ou angústia) sejam compensados conforme a legislação do Brasil mesmo no caso de voos para outros países. Se adotada a Convenção de Montreal, conforme prevê o projeto, não haverá mais essa possibilidade de ressarcimento.

De acordo com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), 1% das despesas das companhias em 2023 foi com assistência a passageiros e indenizações extrajudiciais e 1% por condenações na Justiça. Ao todo, o custo da operação no Brasil foi de R$ 58,2 bilhões, para um faturamento de R$ 64,5 bilhões.

 

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