Domingo, 22 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 5 de julho de 2021
Ganha força a possibilidade de combinar doses de vacinas contra a covid-19 desenvolvidas com tecnologias diferentes, tanto para aumentar a proteção quanto para contornar a falta de imunizantes. É a chamada intercambialidade, palavra que está em alta nos estudos científicos e passa a ser discutida cada vez mais nos programas nacionais de imunização.
No ano passado, a combinação da primeira dose de AstraZeneca com uma segunda de Sputnik V começou a ser cogitada, mas os testes ainda não começaram. Os resultados mais robustos até agora são os que combinam a primeira dose da AstraZeneca/Oxford com uma segunda de Pfizer/BioNTech. A combinação seria mais potente para estimular a produção de anticorpos neutralizantes e a ação de células de defesa T.
Estudos britânicos e alemães apresentados na semana passada chegaram a essa mesma conclusão. Eles reforçaram os achados anunciados em maio pelos testes CombiVacS, liderados pelo Instituto de Saúde Carlos III, em Madri.
Em tese, a combinação da AstraZeneca com a Pfizer atua em duas frentes. A vacina da AstraZeneca/Oxford emprega o adenovírus 5 de macaco, inofensivo para seres humanos, para transportar a proteína S do coronavírus Sars-Cov-2 para dentro das células da pessoa inoculada – método bom para estimular uma resposta potente das células T. Já os imunizantes feitos com mRNA, como o da Pfizer, se revelaram excelentes, segundo a prestigiada revista Nature, para induzir uma elevada produção de anticorpos.
Um estudo nas Filipinas investiga a combinação da CoronaVac com outras seis vacinas aprovadas no país. As possibilidades de intercambialidade são muitas, pois há 16 vacinas contra a Covid-19 aprovadas para uso em um ou mais países.
No entanto, até agora todos os estudos são pequenos. Também é preciso obter mais informações sobre efeitos adversos num prazo maior e com mais pessoas testadas.
O estudo britânico, o Com-COV, realizado na Universidade de Oxford, mostrou que a combinação da AstraZeneca com a Pfizer poderia causar mais efeitos adversos que usar duas doses de uma mesma vacina. Já o estudo alemão, liderado pela Universidade de Saarland, e o espanhol não observaram efeitos diferentes dos vistos com doses do mesmo imunizante.
Margareth Dalcolmo, pneumologista e pesquisadora da Fiocruz, afirma: “O intercâmbio de vacinas é uma possibilidade promissora por múltiplos aspectos. Ele supre a demanda e aumenta a proteção. Mas ainda é preciso saber qual a combinação ideal, em que período entre uma dose outra e em que circunstâncias.”
A cientista coordena no Brasil um estudo internacional liderado pela Austrália para descobrir se a vacina da tuberculose, a BCG, pode servir como reforço para os imunizantes de Covid-19, em caso de necessidade, como o de profissionais de saúde, categoria exposta por mais tempo e a uma maior carga viral.
Os cientistas analisam dados de 2.600 pessoas, todas profissionais de saúde, já vacinadas com a Covid-19 e a BCG, para avaliar a intensidade e a duração de sua proteção contra a infecção pelo coronavírus. O estudo deve durar um ano.
O que a ciência investiga com rigor acontece nas ruas por erro, ignorância e arrogância temerária. A arquiteta Andrea Souto, de 63 anos, fez de tudo para se assegurar que não tomaria AstraZeneca de jeito algum. Ela lera sobre a associação com raros eventos de trombose e se apavorou. “Escolhi a CoronaVac”, diz. E fez uma ronda por bairros da Zona Sul e Oeste do Rio de Janeiro em busca de sua preferida.
Conseguiu a primeira dose e quando voltou para a segunda, em maio, por engano dela e falha do profissional que a vacinou, tomou AstraZeneca.
Fora repreensões e escárnio da família, Souto não sofreu nada. Mas tampouco sabe como anda sua imunidade. Cientistas alertam que misturar vacinas sem que exista orientação é, no mínimo, muito arriscado.
O que Souto fez sem saber, há quem faça de propósito. Além do sommelier de vacina, há também o temerário da autoprescrição. Na fila do posto do Santa Marta, em Botafogo, uma senhora de 81 anos, que já havia tomado duas doses de CoronaVac insistia em esticar o braço para receber a Pfizer, para “dar uma forcinha”. Mas os funcionários do posto a mandaram de volta para casa.
Nos Estados Unidos, algumas pessoas que tomaram a vacina da Johnson & Johnson estão procurando doses adicionais de uma vacina de mRNA, temendo que o primeiro imunizante, de dose única, não as proteja o suficiente do coronavírus. A vacina da J&J é baseada em tecnologia de vetor de adenovírus, semelhante à da AstraZeneca, que os estudos sugerem ter resultados positivos na combinação com a da Pfizer.
No entanto, os Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA recomendam que as pessoas não misturem vacinas até que dados clínicos robustos validem o benefício e suprimam as preocupações sobre os possíveis riscos. As informações são do jornal O Globo e de agências internacionais de notícias.