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Por Redação O Sul | 29 de maio de 2016
Um mecanismo de defesa do cérebro pode ser, ironicamente, uma das causas do mal de Alzheimer, doença sem cura e que provoca a demência. Esta aparente contradição foi proposta por um estudo publicado pelo periódico Science Translational Medicine, e reforça a ideia de que a enfermidade está ligada a diferentes infecções. De acordo com os pesquisadores, ainda são necessários mais estudos, em humanos, mas caso se comprove, a descoberta terá implicações na prevenção e tratamento dessa doença degenerativa.
Conforme estimativas da OMS (Organização Mundial de Saúde), 47,5 milhões de pessoas convivem com algum tipo de demência, sendo que o Alzheimer é responsável por cerca de 70% dos casos. Ainda segundo a entidade, em 2050, esse universo pode passar dos 130 milhões de pacientes, geralmente idosos com mais de 65 anos.
Estudos anteriores explicam que a doença está relacionada ao acúmulo no cérebro de placas formadas pela proteína beta-amiloide. Sua aglutinação entre os neurônios impede a transmissão de sinais, prejudicando a atividade neural. Na prática, a doença leva à degeneração da memória e da capacidade de aprendizado, e pode causar a morte do paciente.
“Por que a beta-amiloide se acumula nas pessoas com o envelhecimento? Ela tem alguma função no cérebro ou é apenas lixo que se acumula?”, questiona Rudolph Tanzi, pesquisador da Escola de Medicina da Universidade Harvard, nos EUA, coautor do estudo.
A equipe de Tanzi, com pesquisadores liderados por Robert Moir, do Hospital Geral de Massachusetts, em Boston (EUA), descobriu que uma certa sequência de aminoácidos da beta-amiloide humana está presente em cerca de 70% dos vertebrados, incluindo o celacanto, uma espécie de peixe que existe há milhões de anos. “É uma proteína muito antiga desempenhando uma função muito importante”, conclui Moir.
Armadilhas para micróbios.
Segundo o estudo, a aglutinação de beta-amiloide, fenômeno hoje visto como patológico, pode ser, na verdade, algo de crucial importância na defesa do organismo. Quando vírus, fungos ou bactérias conseguem romper a barreira hematoencefálica (membrana protetora do sistema nervoso central, que se torna porosa com o avanço da idade), o sistema imunológico forma “armadilhas” com a beta-amiloide. São como teias de aranha, que capturam e matam os micróbios. As mesmas placas, características do Alzheimer, seriam, então, os vestígios dessa batalha.
A equipe já havia confirmado que a proteína é capaz de matar micróbios. Então, o experimento investigou se a proteína também atua dentro do organismo. Os pesquisadores criaram um camundongo geneticamente modificado para desenvolver placas, como humanos, e injetaram bactérias de salmonela em seu cérebro. “Da noite para o dia, as bactérias levaram à formação de placas”, diz Tanzi. Por outro lado, o animal de controle, que não era capaz de gerar placas, morreu rapidamente pela infecção. A hipótese já tinha sido confirmada em neurônios cultivados em fungos e vermes.
Novos testes.
O próximo passo é realizar testes com humanos. Um projeto vai usar tecnologias de sequenciamento genético para procurar por micróbios no cérebro de pessoas que tiveram Alzheimer e de indivíduos que não tiveram. Pesquisadores também vão buscar vestígios de micróbios em placas de beta-amiloide encontradas em cérebros humanos.
O neurologista André Felício lembra que um estudo publicado ano passado identificou infecção por fungos no tecido do sistema nervoso central de pacientes de Alzheimer. As duas descobertas sugerem um novo entendimento sobre a doença, o que pode levar a tratamentos mais eficazes, tanto na prevenção como na resposta. (AG)