Quinta-feira, 31 de outubro de 2024
Por Redação O Sul | 31 de outubro de 2024
Do começo de 2021 até agora, congressistas do PT na Câmara e no Senado destinaram R$ 572 milhões a mais em emendas parlamentares individuais do que os integrantes do Partido Social Democrático (PSD). Mesmo assim, a sigla criada por Gilberto Kassab em 2011 elegeu quase quatro vezes mais prefeitos nas eleições deste ano que o PT. O partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva começará 2025 com 252 prefeitos, enquanto o PSD comandará 891 municípios – foi o partido que mais elegeu prefeitos este ano.
Emendas parlamentares são modificações feitas pelos congressistas no Orçamento para enviar dinheiro federal para suas bases eleitorais. De 2021 até agora, o volume de emendas parlamentares empenhadas (isto é, reservadas para pagamento) aumentou quase 90% em relação ao período anterior (2017-2020). Chegou a R$ 131,7 bilhões.
A enxurrada de dinheiro foi determinante para o resultado eleitoral deste ano. Assim, como explicar o mau desempenho do PT, mesmo com o grande volume de recursos à disposição dos petistas?
Levantamento do jornal O Estado de S. Paulo sugere que o resultado pode estar relacionado à escolha dos petistas sobre onde enviar os recursos: o PSD de Kassab priorizou cidades pequenas, enquanto o PT mandou mais dinheiro para cidades grandes e médias. Além disso, a bancada do PT também enviou mais dinheiro de emendas para outras finalidades – como universidades ou ONGs – enquanto o PSD focou o dinheiro nas prefeituras.
Nos últimos quatro anos, o União Brasil foi o partido com mais emendas individuais pagas, com pouco mais de R$ 7 bilhões. Em seguida vem o PL, com R$ 6,4 bilhões, e depois o PT (R$ 6,2 bilhões). O PSD fica em quarto, com R$ 5,6 bilhões. No entanto, a fatia repassada diretamente para as prefeituras foi maior no caso do PSD do que do PT.
Os congressistas do partido de Kassab enviaram 86% de todas as emendas individuais diretamente para prefeituras (R$ 4,9 bilhões), enquanto os petistas destinaram R$ 4,6 bilhões (74%). Esses repasses para prefeituras podem ser feitos por meio de convênios – para uma obra, por exemplo – ou através das chamadas emendas Pix, verba que cai direto no caixa da prefeitura.
Além de enviar uma fatia menor diretamente para as prefeituras, os congressistas do PT também priorizaram cidades grandes e médias – ao contrário do PSD, que focou em cidades menores. Do total de emendas individuais enviadas por congressistas do PT, 15% (R$ 698,2 milhões) foram para cidades com mais de 200 mil habitantes, consideradas grandes. São as cidades nas quais a disputa pela prefeitura pode ir para o segundo turno.
Já as bancadas do PSD na Câmara e no Senado mandaram só 6% de suas verbas (ou R$ 288 milhões) para o mesmo grupo de cidades com mais de 200 mil habitantes. MDB e PP, que também se saíram bem neste domingo, também alocaram menos verbas para as cidades grandes (11 e 10% do total, em ambos os casos).
Outra forma de olhar o mesmo fenômeno: no PT, 43% da verba de emendas do partido (R$ 1,98 bilhão) foram destinados para as menores cidades do País, com até 20 mil habitantes. No PSD, esse percentual ficou em 56%, mais da metade (ou R$ 2,7 bilhões). No MDB, foi de 47% e no PP, de 51%.
O analista político Thomas Traumann lembra que o PT partiu de uma base menor de prefeitos que o PSD e outros partidos do Centrão – ou seja, os congressistas do partido de Lula já não tinham uma grande base de prefeitos para ajudar a reeleger em primeiro lugar. “Não basta enviar dinheiro de emendas se você não tem o prefeito”, diz ele.
“Mesmo um instrumento que deu certo nas mãos de outros partidos não foi efetivo (para o PT). Isso reforça a conclusão de que o resultado ruim do PT nesta eleição não foi por falta de dinheiro, mas por equívoco na escolha de prioridades”, acrescentou.
A cientista política Lara Mesquita lembra que a taxa de reeleição de prefeitos este ano foi de 82%, a maior dos últimos 20 anos. “Se eu tive uma taxa tão alta de reeleição, e o PT tinha poucas cidades, ele não poderia reeleger muitos prefeitos. A taxa de reeleição do PT, pelo que eu vi, ficou próxima dos demais. Eram poucas cadeiras em disputa, quando a gente pensa nessas altas taxas de reeleição”, diz ela, que é professora da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas.
Lara lembra ainda que o PT nunca teve um grande número de prefeituras em cidades pequenas – o que poderia explicar a escolha dos congressistas em mandar recursos para cidades maiores. “Se eu fosse um deputado ou senador, o que eu faria? Mandaria o dinheiro para uma cidade onde o prefeito vai me dar palanque. E não para uma cidade onde não vou poder levar crédito por aquela emenda”, diz ela. “O forte do PT nunca foi isso que a imprensa chama de ‘grotão’ (cidades pequenas). Nunca chegou perto do MDB, em número de prefeituras, e sempre teve bom desempenho em cidades médias. Talvez estejam focando nisso”, diz ela.