Quase 43% dos alunos de mais de 15 anos no Brasil não entendem o que é inflação, mostra estudo realizado por dois professores da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos. Os adolescentes não souberam responder se poderiam “comprar mais, menos ou o mesmo”, caso sua renda dobrasse em dez anos e, ao mesmo tempo, os preços dobrassem também.
O estudo foi aplicado para uma amostra de estudantes de escolas públicas e particulares do País, usando metodologia do Banco Mundial que avalia o letramento financeiro das populações.
O conceito de juros também não é conhecido por 53% dos jovens brasileiros. Eles não souberam calcular juros de 3% sobre R$ 100. E só 24,53% dos alunos entendem perfeitamente a lógica de juros compostos – de que juros subsequentes incidem sobre um valor acumulado.
Apesar de ruins, os resultados são um pouco melhores dos que apareceram no Pisa, a prova feita pela Organização para a Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE). São perguntas diferentes, mas os resultados da avaliação internacional, divulgados este ano, mostraram que 71,7% dos brasileiros de 15 anos não conseguem fazer os cálculos de um orçamento.
A maioria dos jovens também não entende como funcionam os empréstimos nem sabe analisar extratos bancários.
Segundo o professor da Faculdade de Educação de Stanford e um dos responsáveis pela pesquisa, Guilherme Lichand, a diferença para os resultados da prova internacional pode estar na dificuldade de leitura dos brasileiros. “No Pisa, eles precisam ler e escrever, o que infelizmente é uma dificuldade e eles acabam errando mais as respostas por causa disso”, explica.
As entrevistas da pesquisa de Stanford foram feitas entre agosto e setembro, por meio de um tablet, com mediação de entrevistadores de campo, responsáveis pela leitura e preenchimento do questionário. Elas não exigiam cálculos complexos nem uso de calculadora.
Para Lichand, o resultado é preocupante principalmente em um cenário de apostas online, que invadiram o universo dos adolescentes, e também por causa do Programa Pé de Meia. O programa federal, de incentivo para estudantes do ensino médio, paga R$ 200 mensais, que podem ser sacados ou mantidos na poupança. “O letramento financeiro é importante para essa decisão.”
O estudo faz parte do Equidade.info, plataforma financiada por Stanford que tem coletado dados nas escolas brasileiras a cada 45 dias sobre assuntos diversos, como violência, estrutura, inclusão, entre outros. O trabalho sobre educação financeira teve o apoio também da Fundação Itaú.
No mundo
A professora do Stanford Institute for Economic Policy Research Annamaria Lusardi, também coordenadora da pesquisa, afirma que o déficit em educação financeira ainda é um problema mundial.
Ela é responsável pelo estudo do Banco Mundial, feito em 2015, cuja metodologia foi replicada na pesquisa agora com os alunos brasileiros.
A pesquisa ouviu na época 150 mil adultos em mais de 140 países e os resultados mostraram que só 33% deles podiam ser considerados alfabetizados financeiramente. São pessoas que conseguem responder corretamente a perguntas básicas sobre taxas de juros, inflação, juros compostos e diversificação de risco.
“A alfabetização financeira está ligada a uma variedade de comportamentos, desde a gestão financeira de curto prazo até a capacidade de tomar decisões inteligentes no longo prazo, tornando as pessoas mais resilientes e seguras financeiramente”, afirma Annamaria.
Segundo o estudo do Equidade.info, 40,36% dos alunos brasileiros do ensino médio são financeiramente letrados. Para ter esse resultado, eles precisavam acertar a pergunta sobre inflação, outra sobre juros e uma das duas que falavam sobre juros compostos.
As diferenças de gênero, que aparecem também em avaliações de Matemática, se repetem na educação financeira. Entre as meninas, 31,88% são financeiramente letradas ante 49,37% dos meninos. Pesquisadores têm chamado à atenção para falta de incentivos culturais, familiares e escolares para que meninas se interessem pela Matemática.
A diferença também aparece entre alunos de escolas públicas e privadas. A maior disparidade entre as redes ocorre no tema inflação: 73,92% dos alunos da rede particular acertam a questão, enquanto são 53,89% nas públicas.
A educação financeira faz parte da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que dá as diretrizes para os currículos das escolas do País. Mesmo assim, apenas 59% dos professores afirmaram incluir o tema em suas aulas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.