Acontecimentos como o 7 a 1 para a Alemanha, que completa nesta sexta-feira (8) oito anos, marcam pessoas, mas não definem biografias. Alguns dos principais nomes daquela seleção, protagonista do maior vexame da história do esporte brasileiro, são hoje destaques de equipes do país. Mostram que não há derrota que o tempo e o talento não amenize.
Fred, por exemplo, vive momento de reverências. Chamado de “cone” pela falta de mobilidade e gols no ataque na Copa do Mundo, se despede de sua carreira no sábado, contra o Ceará. As últimas semanas têm sido de homenagens do Fluminense, onde é um dos maiores ídolos de todos os tempos, e da comunidade do futebol brasileiro.
Seu companheiro no setor ofensivo no Mineirão era Hulk. O mesmo camisa 7 que há duas temporadas é o melhor atacante em atividade no futebol do País, com 59 gols em 98 jogos pelo Atlético-MG. Ironia do destino, ele se consagra hoje em dia no mesmo estádio onde viu, sem muito o que fazer, os alemães enfileirarem gols, um atrás do outro.
“O futebol nos dá momentos especiais. Fiquei muito triste, por perder da forma que perdemos na Copa. Mas aí eu volto para o Brasil para ter o Mineirão como a minha casa. Conquistei um título tão importante no lugar onde vivi um vexame”, afirmou o atacante em entrevista em dezembro passado, logo após ser campeão brasileiro com o Galo.
De certa forma, a goleada na semifinal daquela Copa do Mundo respingou menos em Hulk. O resultado pesou mais sobre os jogadores de marcação, envolvidos pela troca de passes alemã. David Luiz, por exemplo, até hoje é lembrado pela entrevista, aos prantos, depois do jogo, lamentando o resultado e dizendo que só queria “ver o povo sorrir”.
O zagueiro retornou ao Brasil sete anos depois, para jogar pelo Flamengo, justamente o clube mais popular. Vive as instabilidades da equipe, mas ainda assim é uma das referências de Dorival Júnior. É com o zagueiro que o rubro-negro tenta encontrar o caminho para brigar pelos títulos da Libertadores, da Copa do Brasil e do Brasileiro.
Tanto ele quanto Hulk são representantes do fenômeno que ganhou corpo na última década, algo que aparentemente veio para ficar: o de jogadores que chegam à seleção sem terem praticamente atuado no futebol brasileiro. Sem grandes vínculos por aqui, tiveram na Copa de 2014 a primeira chance de deixarem uma marca no país de origem. Não conseguiram, ao menos da maneira que esperavam. Anos depois, novas oportunidades foram aparecendo.
É o caso de Willian, consagrado na Europa, reserva na semifinal contra a Alemanha, e que retornou para o Corinthians ano passado. Ele tem sido peça importante na temporada do time paulista, bem no Brasileiro e nas quartas de final da Libertadores. O mesmo cabe a Fernandinho, ídolo do poderoso Manchester City, mas ainda visto com algumas reservas por aqui devido ao 7 a 1 e ao desempenho nas quartas de final da Copa de 2018, contra a Bélgica. Reforço do Athletico, tem boas chances de mostrar porque foi tão estimado por Pep Guardiola no período.
“Tivemos inúmeras propostas, de vários clubes diferentes, do Brasil e de fora. Mas a decisão mais sensata foi voltar para casa e tentar entregar o meu melhor aqui no Athletico agora”, afirmou, ao ser reapresentado pelo Furacão, onde começou a carreira.
Os efeitos do 7 a 1 foram profundos, chegaram ao próprio futebol brasileiro como um todo. Formação de jogadores, estrutura de trabalho, calendário, tudo foi colocado no divã. Acima de tudo, os conceitos de nossos treinadores foram postos na berlinda. E Luiz Felipe Scolari concentrou todo esse questionamento.
Oito anos depois da tarde em que foi atropelado por Joachim Löw, o treinador seguiu em frente. Foi campeão na China e levantou o título brasileiro com o Palmeiras em 2018. Teve trabalhos menos brilhantes também, como as passagens pelo Grêmio, a última em que fez parte da campanha do rebaixamento para a Série B, em 2021.
Este ano, o técnico assumiu o Athletico com plenos poderes – é chefe de si mesmo, diretor de futebol e treinador. Os resultados têm sido ótimos até agora, com a classificação para as quartas de final da Libertadores, a oitava em oito participações na competição sul-americana, e o segundo lugar no Brasileirão após 15 rodadas, apenas dois pontos a menos que o líder Palmeiras.
No último dia 30, Felipão foi um dos pontos centrais das homenagens referentes aos 20 anos do pentacampeonato. O treinador concedeu coletiva para jornalistas que fizeram a cobertura na época, foi aplaudido e chegou a se emocionar, demonstração pouco comum no histórico do gaúcho.
Os envolvidos nunca terão a chance de esquecer aquele 7 a 1 para a Alemanha. Mas o distanciamento ajuda a colocá-lo em seu devido lugar.