Até outubro de 2022, Truong My Lan era um dos nomes proeminentes do setor imobiliário do Vietnã, motor da economia local. Mas, nesta semana, um tribunal do Vietnã confirmou, após apelação, a pena de morte contra ela, envolvida no maior escândalo financeiro da História do país. O tribunal da cidade de Ho Chi Minh decidiu que não havia “nenhuma razão” para reverter a sentença de primeira instância contra Truong My Lan, empresária de 68 anos considerada culpada por uma fraude que totalizou 27 bilhões de dólares.
Truong só enveredou pelo mercado de terrenos e outras propriedades depois que o Partido Comunista promoveu uma reforma econômica, batizada de Doi Moi, em 1986. Poucos anos depois, na década de 1990, já era dona de um “grande portfólio de hotéis e restaurantes”, segundo a BBC. Troung fez parte de um grupo de vietnamitas que prosperou com a especulação imobiliária.
Ao longo dos anos, a magnata vietnamita passou a usar empresas de fachada e representantes para driblar a regulação local e construiu o seu império. Embora a lei do país vede que uma só pessoa detenha mais de 5% das ações de qualquer banco, Truong My Lan conseguiu somar mais de 90% de participação na Saigon Commercial Bank (SCB).
Famosa principalmente na cidade de Ho Chi Minh, ela liderou durante anos a imobiliária Van Thinh Phat e, em 2011, foi autorizada a promover uma fusão de três bancos menores no SCB. Truong foi presa em outubro de 2022, sob acusação de cometer um golpe contra mais de 40 mil pessoas, entre 2012 e 2022, por meio de um esquema de empréstimos do SCB.
Truong foi acusada de criar pedidos falsos de empréstimo para sacar dinheiro do banco num total correspondente a 93% de todo o crédito emitido pela instituição, diz a mídia estatal. Em abril deste ano, o júri rejeitou todos os argumentos da defesa de Truong My Lan, executiva da imobiliária Van Thinh Phat, acusada de cometer crimes e prejudicar o SCB ao longo de uma década.
Segundo a acusação, a partir de fevereiro de 2019, ela mandou que seu motorista retirasse o equivalente a US$ 4 bilhões em dinheiro do banco e guardasse no porão. Truong também teria subornado autoridades para encobrir a fraude.
“As ações dos acusados (…) minaram a confiança do povo na liderança do Partido (Comunista) e do Estado”, afirmou a decisão do júri, noticiada pela imprensa estatal.
Além de Lan, houve outros 85 réus no caso, incluindo ex-chefes de bancos, ex-funcionários do governo e ex-executivos do SBC. O julgamento ocorreu no início deste ano durante cinco semanas no sul da cidade de Ho Chi Minh.
Lan e os outros 85 foram acusados de crimes que vão desde suborno e abuso de poder até apropriação indébita e violação das leis bancárias. A empresária supostamente desviou US$ 12,5 bilhões, mas os promotores disseram que os danos totais causados pelo esquema chegam a US$ 27 bilhões, o equivalente a 6% do PIB do Vietnã em 2023.
Na ocasião da condenação, a empresária negou as acusações e culpou os subordinados pelo ocorrido. Ela e os outros réus foram presos como parte de uma campanha nacional contra a corrupção.
Em sua declaração final ao tribunal, ela sugeriu que havia pensado em suicídio. “Em meu desespero, pensei na morte”, declarou Lan, segundo a mídia estatal. “Estou com tanta raiva por ter sido estúpida o suficiente para me envolver neste ambiente de negócios cruel, o setor bancário, sobre o qual tenho pouco conhecimento.”
A aplicação da pena de morte é comum no Vietnã em casos de tráfico de drogas, mas é rara em crimes financeiros. As estatísticas sobre a pena capital são segredo de Estado, mas, segundo a Anistia Internacional, são realizadas “numerosas” execuções todos os anos no país.
“De acordo com a promotoria, Truong My Lan desempenhou o papel de mentora, mas não admitiu seu crime, foi teimosa, criticou seus subordinados e não expressou nenhum arrependimento”, informou o jornal Tuoi Tre, acrescentando que os outros réus confessaram sua participação no crime.
A magnitude do escândalo levou centenas de pessoas a se manifestarem na capital Hanói e na cidade de Ho Chi Minh, num dos poucos protestos tolerados no país.