Quinta-feira, 17 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 9 de junho de 2024
Desde a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2023, o número de protocolos para moções de aplausos ou de repúdio a temas e personagens variados se multiplicou na Câmara dos Deputados. Reflexo da polarização política no País, as propostas têm sido movidas principalmente por parlamentares apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), sob a justificativa de que determinados assuntos causam “inquietação” no Congresso.
As moções têm pouca serventia do ponto de vista legislativo, mas, na avaliação de especialistas, o instrumento ajuda os parlamentares a ganhar engajamento principalmente nas redes sociais e a centralizar a discussão no mundo virtual em torno de “narrativas” e pautas de interesse desses grupos.
Nestes dois primeiros anos de governo Lula, foram apresentados na Câmara mais de 2 mil requerimentos do tipo. Nas comissões temáticas da Casa, onde esse tipo de proposta é analisado, os congressistas gastam horas discutindo as moções, embora alguns deputados reconheçam, de forma reservada, que elas têm pouca ou nenhuma utilidade prática.
Parlamentares analisaram em 2024, por exemplo, manifestações de louvor aos empresários Elon Musk, dono do X, e Luciano Hang, dono das lojas Havan, e ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e moções de repúdio às cantoras Madonna, Anitta e Pabllo Vittar.
“(As moções) Servem, de uma certa forma, para mostrar essa inquietação. Quando você não tem nada o que fazer, resta o que no Direito se chama de jus sperniandi. O direito da vítima de espernear ao seu algoz”, afirmou o deputado José Medeiros (PL-MT).
Neste ano, mais de 130 requerimentos de moção – de um total de 615 – foram votados e avançaram em colegiados. A maior parte delas tramitou na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, que domina a agenda. Uma em cada três proposições aprovadas no colegiado temático da Câmara foi uma moção, ou de louvor ou de repúdio a alguém ou a algum tema.
Segurança pública
O deputado Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ) criticou esse tipo de iniciativa no colegiado. “Esta é uma comissão cuja maioria faz uma opção por lacração nas redes sociais e por esvaziar um bom debate de ideias na segurança pública. A maior parte tem uma posição extremista e tem como método marcar posições sobre tudo, por meio de moções de aplausos e de repúdio”, disse ele.
Integrantes do colegiado discordam e argumentam que, na Comissão de Segurança Pública, as propostas não tomam muito tempo dos congressistas e ajudam a dar destaque a temas que eles acreditam ter importância.
“Se você olhar pelos índices de produtividade, a comissão (de Segurança Pública) é uma das que mais produzem. As moções são céleres, não tomam muita energia. É uma forma de trazer luz a temas que merecem destaque e deveriam ser tratados com a importância que o tema requer”, afirmou o deputado Marcos Pollon (PL-MS), um dos principais integrantes da bancada da bala.
Bancada da bala
Para o presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, as sucessivas moções pautadas na Comissão de Segurança Pública representam um aceno para as redes sociais e são usadas como demonstração de força de um colegiado dominado por bolsonaristas.
“Se, na prática, a moção não tem efeito, politicamente e nas redes sociais, que é o principal espaço de atuação desses deputados, é uma forma de manter o enquadramento”, afirmou. “Parece que eles são muito mais poderosos do que de fato são, enquadram o debate e deixam o governo refém.”
Como tem a maioria absoluta do colegiado, o presidente da Comissão de Segurança Pública e representante da bancada da bala, deputado Alberto Fraga (PL-DF), costuma pautar os requerimentos em bloco, o que acelera as votações. Segundo Fraga, não há como impedir os deputados de apresentarem os requerimentos para as moções. O dever dele, afirmou, é apenas fazer a filtragem para descartar propostas que não tenham relação com a área da segurança pública.
“Não posso impedir o parlamentar de fazer moções de repúdio ou de louvor. A esquerda, quando faz isso, é porque sabe que a Comissão de Segurança Pública é a única em que o governo não apita nada. Lá é a maioria esmagadora de deputados conservadores”, declarou o deputado do PL.
Para o cientista político Marco Antonio Carvalho, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV), o excesso de moções “banaliza” os requerimentos, que assumem mais uma função ideológica. “Tudo isso tem a ver com posições e tem um cunho ideológico”, disse ele. “O corte é de forte identidade política e religiosa.”