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Colunistas Reféns da própria sorte

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Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

Astrônomos, espantados diante das mais recentes descobertas sobre o universo, têm dito que a vida na terra pode ser uma singularidade de tamanha excepcionalidade que não encontra nenhum paralelo ou explicação racionalmente plausível para estarmos aqui. Seríamos, nessa concepção, milagres que brotaram da poeira do espaço, nervosas partículas conscientes e sensíveis à dor que receberam a graça ou a desgraça de habitar, por um lapso de tempo, um minúsculo pontinho azul da agora tornada inexpressiva Via Láctea. Ela, quem diria, que já foi gigante, hoje se recolhe a uma dentre estimadas 1 trilhão de galáxias espalhadas pelos confins do cosmos. Como se não fosse pouco, milagre semelhante ocorre num nível fundamentalmente menor, quando a combinação extraordinária de coincidências de ordem química nos legou a existência e a consciência, algo de tal sorte inimaginável que não soa exagerado afirmar que todos nós somos uma improbabilidade estatística.

Também assombrosa tem sido a sorte que acompanhou a humanidade até aqui, muito embora alguns sinais indiquem que essa contingência esteja a milímetros do precipício. Cíclica como os grandes eventos naturais ou sociais sempre o foram, a ameaça de extermínio da civilização voltou a rondar o planeta, com os traços e cores igualmente trágicos de outrora e com atores que repetem o “script” macabro que apavorou o mundo durante a “Guerra Fria”. Não mais crianças são treinadas nas escolas para um eventual apocalipse, como faziam os EUA, durante a década de 50 do século passado, no auge da histeria provocada pelo medo de mútua aniquilação entre americanos e soviéticos. Hoje, bilionários constroem “bunkers” em inexpugnáveis montanhas, enquanto a elite política trata de elaborar planos que permitam a cabeça da hidra sobreviver à insanidade humana. Acaso, medo e estupidez voltam a se combinar em funesta simbiose, sempre sujeitos também aos humores das lideranças de plantão, conferindo a esse enredo tétrico uma dose de risco acima do que os sensos mais cautelosos poderiam esperar.

A partir do domínio do átomo, a guerra tem sido uma ideia-força por excelência. Perdura no tempo e desafia o engenho humano a aprimorar sua hoje claudicante estrutura de governança, a exemplo da ONU, que se encontra amarrada e impotente diante das transformações profundas na arquitetura de poder que se redesenha celeremente entre os países. Os conflitos geopolíticos colocam frente a frente colossos atômicos, cujas lideranças não inspiram sequer confiança em seus próprios domínios. Contudo, a ideia da guerra como opção final de mediação terá que ser reconstruída sob uma nova perspectiva. O homem vem elaborando obras notáveis para domar seu espírito animal e conviver em sociedade, mas esse processo, que tem no Estado de Direito um dos seus pilares, não vem garantindo plenamente a paz. A guerra na Ucrânia, os conflitos no Oriente Médio, as centenas de confrontos regionais, os ataques contra minorias, os assassinatos, a criminalidade e tantas formas de violência demonstram como ainda estamos distantes de um ideal civilizatório e perto, muito perto, da barbárie.

Além disso, acumulam-se tensões crescentes pela hegemonia econômica, bem como armadilhas que podem colocar em risco a vida no planeta, como a irresolvida questão nuclear, do clima e agora dos riscos da inteligência artificial. Em todas elas, a necessidade de colaboração e cooperação, indissociáveis de um horizonte seguro para todos nós. Se há razões para duvidar da racionalidade como capaz de encaminhar uma paz duradoura, baseada em princípios que o homem esculpiu, como no belíssimo documento da declaração universal dos direitos humanos, também existem sobradas razões para colocar em xeque as religiões como anteparo às barbáries. Os textos sagrados, apesar de conterem as sementes para o diálogo entre os homens, também oferecem interpretações que segregam, fomentam o ódio, a intolerância e o desejo da supremacia de um único Deus. Nesse quadro, continuar contando com a sorte parece ser nosso inescapável destino.

Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.

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