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Reino Unido deporta mais de 600 brasileiros em “voos secretos”

Itamaraty disse que o retorno dos brasileiros foi voluntário. (Foto: Arquivo/Mtur)

Mais de 600 brasileiros, incluindo 109 crianças, foram deportados do Reino Unido em três voos secretos do governo, entre agosto e setembro deste ano. A informação foi apurada e publicada pelo jornal britânico “The Guardian”. Segundo a publicação, o número é recorde: o país nunca deportou tantas pessoas de uma mesma nacionalidade em voos desse tipo.

No entanto, o Itamaraty disse que o retorno dos brasileiros foi voluntário. “Importante esclarecer que não se trata de deportação, e sim de decisão voluntária dos participantes de aderir à iniciativa britânica”, afirmou em nota.

O governo britânico disse ao “Guardian” que está intensificando as medidas contra a migração ilegal. Organizações que protegem os direitos de imigrantes latino-americanos no Reino Unido expressaram preocupação, especialmente com o alto número de crianças retiradas do país.

Números de deportação publicados na última quinta-feira (28) pelo Ministério do Interior britânico, órgão responsável pelas políticas de migração, mostram que 8.308 retornos forçados e voluntários foram feitos entre julho e setembro de 2024. A quantidade é 16% maior em relação ao mesmo período do ano passado.

A maioria das viagens (6.247) foi voluntária, segundo o relatório. O governo oferece incentivos de até 3.000 libras (cerca de R$ 22 mil) para pessoas que aceitam ser deportadas voluntariamente do Reino Unido. Apesar de ter divulgado os números, o Ministério do Interior escondeu que o destino dos voos com quantidade recorde de imigrantes era o Brasil.

Os três voos relatados pelo “Guardian” aconteceram em um período de menos de dois meses — a reportagem não cita para quais cidades brasileiras foram levados os imigrantes:

– Em 9 de agosto, 205 pessoas foram deportadas, entre elas 43 crianças;
– Em 23 de agosto, 206 foram deportadas, incluindo 30 crianças;
– Em 27 de setembro, foram 218 deportados, 36 deles crianças.

O jornal menciona que todas as crianças retiradas do país faziam parte de unidades familiares. Muitas delas estavam matriculadas em escolas e passaram a maior parte — ou toda a vida — no Reino Unido. De acordo com a reportagem, as deportações de brasileiros foram classificadas pelo governo como voluntárias e incluíram pessoas que ultrapassaram o prazo de permanência de seus vistos.

“Estamos preocupados com o aumento acentuado nos retornos voluntários de brasileiros no último ano”, afirmou a organização Coalition of Latin Americans in the UK (Coalizão de Latino-Americanos no Reino Unido) em comunicado publicado pelo “Guardian”. A entidade acrescentou:

“Como a maior comunidade latino-americana no Reino Unido, os brasileiros enfrentam barreiras significativas para acessar informações de alta qualidade e aconselhamento jurídico credenciado, especialmente em seu próprio idioma.”

“Muitos chegaram por meio da migração de países da União Europeia. No entanto, as mudanças nas regras de imigração pós-Brexit deixaram centenas deles e seus familiares fora da UE, com risco de terem seus direitos negados devido à desinformação e aos rigorosos requisitos de elegibilidade.”

Com a saída dos britânicos da União Europeia, aprovada em um plebiscito em 2016, pessoas que planejavam se mudar entre países do bloco e o Reino Unido passaram a não ter mais permissão automática para a nova residência. A regra passou a valer em 2021, quando entrou em vigor um acordo para definir os termos do Brexit.

Ao “Guardian”, um porta-voz do Ministério do Interior britânico disse que o governo está cumprindo um plano de aumentar a deportação de imigrantes ilegais. “Isso reduzirá nossa dependência de hotéis e custos de acomodação, economizando cerca de 4 bilhões de libras nos próximos dois anos.”

Em abril deste ano, o Parlamento do Reino Unido aprovou uma lei para permitir que o governo force imigrantes que chegaram de qualquer lugar do mundo e pediram asilo em solo britânico a entrar em um avião que os leve para Ruanda – mesmo que a pessoa nunca tenha pisado em Ruanda.

A medida era uma das principais bandeiras do ex-primeiro-ministro, Rishi Sunak, que é filho de imigrantes indianos. Em junho, o primeiro voo para levar requerentes de asilo para Ruanda foi suspenso, depois que o tribunal europeu de direitos humanos emitiu liminares para impedir a deportação de imigrantes a bordo.

 

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