Pelo menos, 944 prisioneiros esperam comemorar nas ruas a vitória de Donald Trump nas eleições presidenciais. Mas só depois que o presidente eleito tomar posse, em 20 de janeiro. Trump prometeu repetidamente conceder perdão presidencial a todos os condenados pelo ataque ao Congresso em 6 de janeiro de 2021. Por enquanto, ainda esperam que o presidente eleito cumpra a promessa.
No total, 1.488 pessoas foram presas e condenadas por invadir o Capitólio, edifício que abriga o Congresso americano, em Washington, D.C., incitadas por Trump, para tentar impedir o procedimento parlamentar de conferência de votos e da certificação da vitória de Joe Biden nas eleições de 2020. Foi uma tentativa dos invasores — frustrada no final das contas — de reverter o resultado das eleições a favor de Trump.
Nas promessas que fez de conceder a eles o perdão presidencial, Trump apresentou suas justificativas – todas consideradas sem mérito pela comunidade jurídica – para fazer isso: eles são “guerreiros”, “patriotas incríveis”, “prisioneiros políticos”, “reféns políticos” e “a Justiça foi muito dura com eles”. Ele repetiu isso em comícios e em entrevistas (sem contestação) à mídia amigável.
Do total de invasores processados, 172 foram condenados à prisão residencial e 31 à prisão fechada, convertida em domiciliar posteriormente. Muitos réus ainda respondem a processo criminal – e também podem ser beneficiados pelo perdão presidencial e arquivamento do caso.
Processos
O maior beneficiário da vitória de Trump, no entanto, será o próprio Trump. Ele prometeu demitir o procurador especial do Departamento de Justiça (DOJ), Jack Smith, que vem trabalhando em ações criminais contra ele na Justiça Federal há exatamente dois anos, desde novembro de 2022. Ele declarou que demitirá Smith “dentro de dois segundos” – isso se o procurador não se afastar antes.
Trump já estabeleceu uma condição para nomear um procurador-geral do DOJ: o candidato terá de concordar em pedir o encerramento dos dois processos contra ele na Justiça Federal, para extingui-los definitivamente. E contribuir para a extinção de outros processos criminais e civis que tramitam em jurisdições estaduais.
Na esfera federal, tramitam duas ações criminais contra ele – uma no Distrito de Colúmbia (em Washington) e outra na Flórida.
Em Washington, D.C., Trump responde a quatro acusações criminais por sua responsabilidade na invasão do Congresso em 2021. O caso está paralisado desde que seus advogados recorreram à Suprema Corte, pedindo uma análise da imunidade presidencial.
O recurso foi bem-sucedido, como se sabe, porque, nessa decisão, a Suprema Corte declarou que ex-presidentes:
* 1) têm imunidade absoluta por seus atos no exercício de seus poderes constitucionais;
* 2) têm presunção de imunidade por quaisquer outros atos oficiais;
* 3) não têm imunidade apenas por seus atos não oficiais.
Assim a juíza Tanya Chutkan, que preside esse julgamento, marcou prazos de novembro a dezembro para as partes argumentarem (e ela decidir) se Trump tem imunidade ou não a cada uma das acusações. A juíza não conseguirá levar o caso em frente antes que Trump e seu novo procurador-geral matem o processo.
Na Flórida, o caso já está um pouco mais complicado. O procurador-geral do DOJ apresentou 34 acusações criminais contra Trump, por desvio ilegal de documentos sigilosos da Casa Branca, quando deixou o governo em 2021, alguns deles com o carimbo de “secreto” ou mais que isso: “top secret”.
Não há defesa fácil para essas acusações. Mas a juíza federal Aileen Cannon achou uma solução favorável para o presidente que a nomeou para o cargo: trancou a ação com base no entendimento de que a nomeação do procurador especial, Jack Smith, foi irregular, porque não teve aprovação do Senado.
Smith recorreu ao Tribunal Federal de Recursos da 11ª Região, com boa chance de ser bem-sucedido, baseado em precedentes e fatos históricos. No entanto, o tribunal não irá, provavelmente, decidir o caso antes de Trump mexer os pauzinhos (de forma lícita, mas nem tanto ética) para extinguir a ação.
Esfera estadual
Em um dos processos na esfera estadual, em que Trump foi acusado, na Geórgia, de tentar subverter o resultado da eleição no estado, por meio de tentativas de corromper o processo de certificação da vitória de Joe Biden, não há muito o que o DOJ possa fazer para salvar o presidente eleito.
Mas os advogados de Trump apelaram para uma tática que embolou o meio de campo: apontaram um conflito de interesse (financeiro) da procuradora do estado, Fanny Willis (que processou o então ex-presidente), por seu envolvimento romântico com um procurador especial que ela contratou para tocar o caso.
Os advogados pediram a desqualificação da procuradora, sob a suspeita de ela ter contratado o procurador, com dinheiro público, para beneficiar uma pessoa com a qual tinha um affair. Dê no que dê, a ação pode ficar prejudicada pelo fato de Trump ter sido eleito.
Em Nova York, um júri considerou Trump culpado das 34 acusações apresentadas contra ele, por falsificação de registros contábeis – uma manobra para esconder um pagamento de suborno à ex-atriz pornô Stormy Daniels, com o objetivo de silenciá-la sobre uma relação extraconjugal de Trump, o que poderia descarrilhar sua candidatura a presidente em 2016. (João Ozorio de Melo/ConJur)