Devido ao cenário persistente de transmissão descontrolada da covid-19 no Brasil, a estratégia mais adequada para governos e prefeituras é aplicar a terceira dose da vacina em idosos maiores de 70 anos, em vez de adiantar a segunda dose entre os mais jovens ou inaugurar a imunização entre adolescentes. A avaliação foi feita pelo virologista da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rômulo Neris.
A melhor estratégia de vacinação está no centro do debate da pandemia e divide gestores públicos locais, sobretudo em meio à oferta irregular de imunizantes pelo governo federal. Neris argumenta que o número de hospitalizações de idosos maiores de 70 anos aumenta no Brasil, o que estaria relacionado à queda na eficácia contra casos graves das quatro vacinas disponíveis no País especificamente para esse público.
A reboque, diz, também devem ser considerados para essa dose de reforço os idosos de menor idade, mas com comorbidades.
Sobre a natureza do reforço, ele afirma que o ideal seria um esquema “heterólogo”, ou seja, aplicar vacinas de RNA mensageiro (Pfizer e Moderna) em indivíduos previamente imunizados com as de vírus inativado (Coronavac) ou de vetor viral (AstraZeneca), a fim provocar o sistema imune por outros caminhos e alcançar resposta mais completa.
O objetivo por trás da indicação é evitar nova alta no número absoluto de óbitos entre idosos e proteger o sistema público de saúde de picos de internação. Isso, diz Neris, é mais importante que acelerar a vacinação entre os mais jovens, estratégia que visa aumentar a chamada imunidade de rebanho e deve passar ao médio prazo. O foco dessa última estratégia é diminuir os níveis de transmissão, o que é especialmente importante ante o avanço da variante delta e, por isso mesmo, não deve ser abandonado.
Ele foi enfático ao dizer que, até o momento, os estudos não indicam a necessidade de vacinar pela terceira vez pessoas saudáveis com menos de 70 anos. “Não há nada que sugira ou suporte, nesse momento, o uso de terceira dose em adultos saudáveis e idosos com menos de 70 anos. A princípio, para esse público, duas doses seguem suficientes, conferindo percentual alto de proteção por pelo menos um ano ou um ano e meio desde o início dos estudos com a população”, disse. Dessa forma o caminho natural seria revacinar os mais idosos e retornar o foco para os mais jovens que ainda devem completar o esquema vacinal.
Neris diz não haver dúvidas sobre a circulação e avanço no País da variante delta, mas afirma que ainda não é possível definir se há dominância, como têm feito governos e prefeituras, porque os esforços de sequenciamento genômico do país guardam vieses estatísticos impostos pela própria estratégia federal de vigilância genômica, que prioriza pacientes com infecção suspeita de novas variante e seus contatos, como viajantes.
Neris reconhece o subdimensionamento de casos registrados pelo Ministério da Saúde — que só atesta o caso mediante sequenciamento —, mas afirma que a incidência de quase a metade dessas ocorrências no Estado do Rio o credenciam como novo epicentro da pandemia.