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Roberto Campos Neto: um presidente do Banco Central de quem Lula sempre desconfiou e que a direita sonha em lançar como candidato em 2026

Por enquanto, Campos Neto nega a intenção de entrar na política. (Foto: Pedro França/Agência Senado)

A dois dias da posse de Luiz Inácio Lula da Silva para o seu terceiro mandato, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, se dirigiu ao hotel onde o presidente eleito estava hospedado e que se transformara numa espécie de QG do petista antes dele voltar ao Palácio do Planalto. Era o primeiro encontro entre os dois e o futuro ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também estava presente.

A conversa de meia hora foi interrompida algumas vezes por assessores, não deu liga e azedou de vez a relação pelos próximos dois anos. Nomeado por Jair Bolsonaro em fevereiro de 2019, Campos Neto foi à reunião com a sensação de já haver uma situação posta de antagonismo com o Banco Central autônomo, aprovado dois anos depois. O presidente do BC se apresentou, disse a Lula e a Haddad que sempre teve autonomia na instituição e que era preciso ter essa mesma liberdade dali em diante. Defendeu equilíbrio das contas públicas e a institucionalidade do país.

Lula falou pouco. Esperava menos discurso – ou “menos aula”, como confidenciou depois a um interlocutor. Haddad tentou contemporizar. Disse que Campos Neto era novo e com pouco conhecimento de política, mas não o convenceu. O que se seguiu àquele encontro foi uma relação tensa, difícil e com críticas duras e frequentes. Lula nunca engoliu não poder indicar (e demitir) o presidente do BC e vê Campos Neto como “bolsonarista”. Em junho, em entrevista a uma rádio maranhense, chegou a chamá-lo de “adversário político e ideológico”.

Nem mesmo o churrasco do fim do ano passado de Lula na Granja do Torto foi capaz de apaziguar a relação. Campos Neto foi ao encontro com todos os ministros, mas a falta de entrosamento ficou clara. Acabou a maior parte do tempo próximo a Haddad, com quem também mantém relação tortuosa. O ministro da Fazenda se queixa das observações que Campos Neto faz sobre a política fiscal – por vezes apontada como causa importante dos juros elevados. O presidente do BC já frisou em entrevistas que o país precisa de “um choque fiscal” para derrubar os juros – hoje a taxa Selic definida pelo BC está em 10,75%

“Eu acho que demorou um tempo também para eles entenderem o que é autonomia, o que significa isso e que, no final das contas, nenhum Banco Central quer subir juros. A gente quer trabalhar com juros o mais baixo possível”, se defende Campos Neto, lembrando também que subiu os juros para 11,75% em 2022, pleno ano eleitoral.

São dois os principais argumentos apresentados pela esquerda para questionar a imparcialidade de Campos Neto no comando do Banco Central. O primeiro deles, a votação com camisa da Seleção Brasileira em 2022, o uniforme preferido dos apoiadores de Bolsonaro na eleição em que foi derrotado por Lula. Reservadamente, agentes do mercado e diretores de grandes bancos também viram o ato como uma escorregada.

Ele interpreta a situação como um ato privado e não público, e diz que não achava que isso poderia ter conexão com a forma de atuar no BC, justamente porque ocorreu depois de uma sequência de subidas de juros. Avalia, contudo, que poderia ter agido de maneira diferente.

O segundo episódio se deu em junho, quando o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, promoveu um jantar para Campos Neto no Palácio dos Bandeirantes, após o presidente do Banco Central ser homenageado com uma medalha na Assembleia Legislativa. Foram cerca de 60 convidados, entre empresários, banqueiros e políticos.

Entre um cardápio com carne, salmão e massa, Tarcísio discursou orgulhoso da amizade que mantém com Campos Neto e chamou o amigo de “extraterrestre” por, segundo ele, ter uma inteligência acima da média. A reunião tirou Lula do sério porque, a partir dali, saíram as especulações de que Campos Neto aceitara ser ministro da Fazenda de um eventual governo Tarcísio, caso seja o nome da direita para as eleições de 2026. Os dois são amigos próximos, numa relação que começou por conta das viagens que o então ministro da Infraestrutura do governo Bolsonaro fazia pelo mundo para vender ativos brasileiros.

O presidente do BC ajudava a compor a apresentação de slides que Tarcísio faria no exterior, com dados e detalhes sobre a situação do país. Foram dezenas desses encontros que fizeram os dois se aproximarem e estenderem essa relação para o campo pessoal. Os encontros entre os dois hoje são frequentes. As famílias também passaram a conviver juntas.

Não é de hoje que especulações ocorrem sobre uma possível entrada do presidente do Banco Central na política. Presidente do PP, o senador Ciro Nogueira chegou a sugerir que ele fosse o sucessor de Bolsonaro em caso de vitória da direita, em 2022. Mesmo com o insucesso, Nogueira segue em campanha para convencê-lo da ideia.

Por enquanto, Campos Neto nega a intenção. A família preferiu não se mudar para Brasília — o acordo inicial com a mulher e os filhos, aliás, eram apenas quatro anos na capital do país. Tempo que precisou ser ampliado quando a autonomia foi aprovada e o manteve no cargo até 2024. Está em São Paulo um dos seus hobbies preferidos: surfar em uma piscina de ondas instalada na Fazenda Boa Vista, condomínio exclusivo onde tem casa. As informações são do jornal O Globo.

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