Quarta-feira, 23 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 8 de junho de 2022
Em paralelo aos conflitos entre os militares russos e ucranianos no leste da Ucrânia, a Rússia se ocupa em restaurar a infraestrutura de transporte e de outras áreas importantes no território ocupado do sul do país. Após conquistar a região durante a guerra, os russos querem estabelecer um “tráfego de pleno direito” entre o próprio país e a Crimeia, ocupada em 2014 e localizada no extremo sul da Ucrânia, entre o Mar de Azov e o Mar Negro.
Os objetivos russos foram declarados pelo ministro da Defesa do país, Sergei K. Shoigu, na terça-feira (7). Segundo Shoigu, os militares trabalham com a Russian Railways, companhia ferroviária estatal, para reparar cerca de 1,2 mil quilômetros de trilhos no sudeste da Ucrânia. Os trilhos sairiam da Rússia e atravessariam a região do Donbas, no leste da Ucrânia, e a cidade de Kherson antes de chegar à Crimeia.
Além das obras de transporte, Shoigu também informou que as tropas russas desobstruíram o canal que leva água até a Crimeia, cortado pela Ucrânia após a anexação da península pelo Kremlin em 2014. A água voltou a fluir normalmente até o território anexado, segundo o ministro. Imagens de satélite mostram que partes do canal que estavam secas até março deste ano, no início da invasão, agora possuem água.
O ministro também afirmou que a Rússia trabalha para reabrir os portos ao longo da costa ocupada no sul da Ucrânia. Segundo ele, ao menos dois portos – Berdiansk e Mariupol – foram limpos de minas deixadas pelas forças ucranianas em retirada e estão prontos para retomar as operações.
O jornal The New York Times informou que atestou o retorno da água pelo canal da Crimeia, mas não conseguiu verificar as outras alegações russas. As autoridades ucranianas não comentaram o assunto.
Os anúncios de Shoigu mostram que, embora Moscou tenha redirecionado a maior parte das forças de combate para os conflitos na região do Donbas, a Rússia também trabalha para consolidar o domínio sobre as terras conquistadas no sul. A criação da ponte terrestre entre a Rússia e o território ocupado cumpriria um dos principais objetivos do Kremlin, segundo os analistas.
Com mais de 100 dias de guerra, a Rússia passou a ocupar 20% do território da Ucrânia. A maior parte se estende pelas regiões de Kherson e Zaporizka. Nas duas regiões, eles introduziram a moeda russa e nomearam representantes, sinalizando a intenção de anexar essas terras. Agora, esse objetivo se torna ainda mais claro com o anúncio da restauração da infraestrutura.
A retomada do canal da Crimeia, chamado Canal da Crimeia do Norte, é um prêmio importante para os russos. O canal chegou a representar 85% da água doce utilizada pelos moradores da península até 2014, quando o território foi anexado pela Rússia e o governo ucraniano construiu uma barragem na cidade de Kalanchak para bloquear o fluxo da água para o sul. A anexação da Crimeia foi um movimento considerado ilegal pela Ucrânia e seus aliados ocidentais.
O canal é considerado vital de guerra para os planos de longo prazo do Kremlin, na visão de Petro Lakichuk, analista do Centro de Estudos Globais “Estratégia XXI”, baseado em Kiev. A retomada aconteceu horas depois da invasão russa na Ucrânia iniciar, no dia 24 de fevereiro.
Os analistas também afirmam que a restauração das linhas ferroviárias também pode ajudar os russos ao permitir um fluxo de armas pesadas da Rússia para o território ocupado através de linhas férreas. Além disso, serviria como um ponto de apoio para as forças que estão no Mar Negro.
Rota terrestre
A rota terrestre entre a Rússia e a Crimeia foi adiada durante meses pela dificuldade da Rússia em conquistar a cidade de Mariupol, que teve a batalha mais sangrenta da guerra até o momento. Combatentes ucranianos resistiram de março até meados de maio, apesar de estarem em menor número e desarmados, e atrasaram os planos russos.
O território que se estende pelo leste e sul da Ucrânia, ao longo da costa do Mar Negro até a Crimeia, é chamado pelo presidente russo Vladimir Putin de “Nova Rússia”. A captura de Mariupol representou um passo fundamental para o cumprimento deste objetivo e rapidamente o Kremlin agiu para instituir o rublo, redirecionar conexões de internet para servidores russos e substituir operadoras de celular ucranianas por russas. Até o código do país do telefone foi alterado para o da Rússia.
Segundo o chefe ucraniano da administração regional de Kherson, Hennadii Lahuta, o Kremlin planeja realizar um referendo no último trimestre deste ano para incorporar a região à Rússia. As autoridades ucranianas prometeram lutar contra tal medida, mas até o momento a contra-ofensiva na região não conseguiu retomar muitos territórios. As informações são dos jornais O Estado de S. Paulo e The New York Times.