Segunda-feira, 10 de março de 2025
Por Redação O Sul | 28 de agosto de 2024
Em 2022, as pesquisas eleitorais foram duramente criticadas em razão das divergências entre os levantamentos divulgados na véspera do primeiro turno e os resultados apurados nas urnas. Um dia antes da eleição, Jair Bolsonaro (PL) aparecia com 37% e 36% dos votos válidos nas pesquisas do Ipec (ex-Ibope) e Datafolha, respectivamente, e recebeu 43% dos votos. Luiz Inácio Lula da Silva (PT) marcava 51% e 50% nos levantamentos, e terminou com 48%. Discrepâncias também foram observadas nas disputas estaduais e na eleição para uma vaga no Senado.
Embora tenham tomado conta das discussões há dois anos, diferenças entre as pesquisas e os resultados não são exclusivas do último pleito e, segundo analistas, ocorrem em todas as eleições. Em 2018, por exemplo, Bolsonaro, então do PSL, tinha 41% na pesquisa de véspera do Ibope, enquanto Fernando Haddad (PT) tinha 25%. O resultado nas urnas foi 46% para o ex-presidente e 29% para o petista.
A campanha eleitoral deste ano deve colocar as pesquisas novamente em evidência. Para esclarecer dúvidas de eleitores de todo o País que vão às urnas em outubro, Especialistas explicam como os levantamentos são realizados e quais cuidados são necessários ao interpretá-los.
Metodologia
Com o aumento das pesquisas autofinanciadas (pagas pela própria empresa que realizou o levantamento), a atenção aos detalhes metodológicos se torna crucial. Analistas alertam sobre práticas e problemas que podem comprometer a qualidade dos resultados, exigindo maior cautela dos eleitores.
“Via de regra, quanto menos detalhes sobre sua metodologia o instituto divulgar, se atendo apenas ao que é minimamente obrigatório segundo o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), mais cuidado se deve ter com relação às suas pesquisas”, disse o integrante da Associação Americana para Pesquisa de Opinião Pública (AAPOR) e diretor de amostragem na Universidade de Michigan, Raphael Nishimura.
Outro ponto destacado por ele é verificar a fonte de dados utilizada para a amostragem. Se o instituto usa apenas dados do Censo 2010, isso deve acender um sinal de alerta, pois há dados mais recentes a respeito da população, como os da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua.
“O questionário também é importante: se a pesquisa não utiliza um disco para apresentar os candidatos (em pesquisas presenciais) ou não realiza uma rotação aleatória da ordem em que os candidatos são apresentados na pergunta de intenção de voto estimulada (em pesquisas telefônicas ou online), há um grande risco de ocorrerem vieses de mensuração. Como os institutos são obrigados a depositar seus questionários no site de consulta de pesquisas do TSE, isso é relativamente fácil de verificar”, pontuou Nishimura.
Recurso valioso
As pesquisas podem ser um recurso valioso para os eleitores. A premissa básica para que esses levantamentos ajudem, e não atrapalhem, é enxergá-los como uma fotografia do cenário atual. Embora sejam úteis para diagnosticar a conjuntura política e orientar as campanhas, não devem ser vistos como uma tentativa de prever o resultado das urnas, pois o contexto político é dinâmico e o voto dos eleitores é influenciado por fatores que as pesquisas muitas vezes não conseguem captar, especialmente aqueles que surgem nos momentos derradeiros da disputa. A única pesquisa que tem o objetivo de alcançar o resultado final é a de boca de urna, que não foi feita em 2022.
Boca de urna
CEO do Ipec, Márcia Cavallari disse considerar naturais as divergências entre as pesquisas de véspera e o resultado final. Segundo ela, essas diferenças são causadas pelas mudanças de última hora que acontecem em todas as eleições. A polêmica em torno de 2022 ocorreu principalmente em razão da ausência da pesquisa de boca de urna, que geralmente capta essas movimentações finais e minimiza a diferença entre os resultados das pesquisas e o registro efetivo das urnas, observou. No caso de 2018, Bolsonaro subiu para 45% na boca de urna e Haddad, para 28%, num cenário mais próximo do que foi o resultado.
Embora os diagnósticos sobre 2022 variem entre especialistas, há desafios que podem ajudar a explicar as discrepâncias observadas. Uma dificuldade enfrentada pelos institutos foi o atraso na divulgação dos dados do Censo, prejudicando a criação de uma amostra mais precisa do eleitorado brasileiro.
Este ano, porém, os desafios são maiores, pois ainda não foram divulgadas outras variáveis do Censo que são utilizadas para a elaboração das amostras, como escolaridade, renda, raça, religião e População Economicamente Ativa. “Caso o Censo não divulgue esses dados dos municípios antes das eleições – os últimos disponíveis para a elaboração das amostras são os do Censo de 2010 –, teremos que trabalhar com estimativas levando a amostras ainda menos precisas”, afirmou Márcia Cavallari.
Outro empecilho amplamente discutido é a abstenção. No Brasil, como o voto é obrigatório, analistas dizem que é menos provável que um eleitor admita que não irá votar. Por isso, os institutos desenvolveram métodos próprios para calcular a abstenção, que atinge cerca de 20% dos eleitores, especialmente os mais pobres. Em 2022, a abstenção desproporcional entre eleitores pobres pode ter sido decisiva para a superestimação dos votos de Lula nas pesquisas de véspera, avaliou o diretor da Quaest, Felipe Nunes. (O Estado de S. Paulo)