Terça-feira, 29 de abril de 2025
Por Redação O Sul | 12 de novembro de 2023
A história de Josef Mengele, o cruel médico nazista que viveu quase 20 anos foragido no Brasil, já deveria ter sido contada de forma adequada há muito tempo, mas coube à jornalista Betina Anton a missão de relatar este caso, que beira o inacreditável, no livro-reportagem “Baviera tropical”. Mengele, para quem não sabe, era um dos principais médicos do campo de concentração de Auschwitz durante a Segunda Guerra Mundial.
Conhecido como o “Anjo da Morte”, tirou a vida de milhares de prisioneiros, muitos deles usados como cobaias em macabras experimentações científicas. Após a queda do Terceiro Reich, veio para a América do Sul, onde viveu de forma anônima graças a amigos que preservaram sua identidade até após sua morte, em 1979, no litoral paulista.
Betina fez um amplo trabalho investigativo calcado em entrevistas inéditas, documentos oficiais e dezenas de cartas do próprio Mengele. A relação de dela com o tema não surgiu do acaso. Durante a infância, numa escola na zona sul da capital paulista, ela foi aluna de Liselotte, professora com sotaque alemão e de aparência inofensiva, mas que secretamente abrigava Mengele em sua casa.
Argentina, Paraguai, Brasil
O primeiro refúgio sul-americano de Mengele foi na Argentina, país então presidido por Juan Domingo Perón, simpatizante do nazismo. A queda de Perón, em 1955, aliada ao crescente interesse pela prisão de criminosos de guerra, entretanto, arruinou os planos do médico. Logo, ele abandonou a esposa e mudou-se para o Paraguai, do ditador Alfredo Stroessner.
Foi nos anos 1960, com a Mossad (agência de inteligência de Israel) no seu encalço, que Mengele fugiu novamente, dessa vez para o Brasil, onde encontrou sua Baviera Tropical. O nazista morou em São Paulo por quase duas décadas, especificamente nos municípios de Nova Europa, Serra Negra, Caieiras e Diadema. Inicialmente, adotou o nome de Peter Hochbichler (ou “seu Pedro”), mas depois passou a usar a identidade de Wolfgang Gerhard.
Mengele sempre esteve um passo à frente das autoridades. Ele recebia dinheiro que vinha da Alemanha e desfrutava de uma vida pacata; gostava de vinho e música clássica. Entre os momentos de maior adrenalina, a vez que salvou a vida de um bêbado caído à beira de um riacho ou quando se submeteu a uma cirurgia para remover uma bola de pelos presa em seu estômago – havia engolido muitos fios de seu vasto bigode.
Ao final de “Baviera Tropical”, a autora detalha a extraordinária resolução do mistério. Em 1985, celebrava-se 40 anos da libertação de Auschwitz. A essa altura, as atrocidades de Mengele eram de conhecimento público e o objetivo era localizar seu paradeiro o mais rápido possível. Mas já era tarde.
Quando as autoridades encaixaram todas as peças do quebra-cabeça e fizeram a exumação do corpo, esclareceram a dúvida mundial: o idoso que morrera afogado na Praia da Enseada, seis anos antes, e fora enterrado em Embu das Artes (SP), era mesmo o nazista mais procurado do planeta.
No fim, nem Mengele nem seus cúmplices jamais sofreram qualquer punição.