Os americanos elegeram o ex-presidente Donald Trump à Presidência quatro anos depois de ele ter incitado um motim no Capitólio para tentar impedir sua remoção do poder. Sua eleição, provavelmente, colocará a democracia do país novamente sob um enorme estresse. Na última década, ele demonstrou ter pouco respeito pelos pesos e contrapesos que definiram o governo americano desde o amanhecer da república.
Como foi durante o primeiro mandato, a nação está prestes a ser governada pelos caprichos de um presidente com pouco interesse nos detalhes da política. Aqui estão algumas conclusões de uma eleição que novamente revoluciona a política americana.
* Democracia dos EUA sob tensão
Trump já procurou minar a independência do Judiciário. Durante seu primeiro mandato, exigiu lealdade pessoal de autoridades em todo o ramo do Executivo e demitiu aqueles que resistiram às suas exigências. Agora, ele retorna à Casa Branca com o conhecimento de como o sistema restringiu seus impulsos e com uma lista de funcionários mais dispostos a ajudá-lo a contornar as normas.
Na última vez que assumiu o cargo, uma cultura de resistência surgiu de cantos que incluíam democratas, os funcionários do governo federal e até alguns de seus próprios nomeados. Desta vez, é improvável que ele nomeie pessoas dispostas a falar contra ele. Seu círculo de aliados influentes agora inclui homens como o senador J.D. Vance, de Ohio, vice-presidente eleito; o bilionário da tecnologia Elon Musk; e Robert F. Kennedy Jr., o teórico da conspiração que há muito duvida da ciência das vacinas.
Trump será um presidente que já incitou violência política e prometeu usar o Exército contra seus oponentes domésticos, uma perspectiva que pode esfriar a resistência pública às suas ambições de ultrapassar limites.
* Grande reviravolta
Trump prometeu uma grande expansão de sua repressão à imigração durante seu primeiro mandato. A relativa estabilidade em assuntos domésticos e internacionais nos últimos quatro anos está prestes a desaparecer, substituída por um presidente volátil, que muitas vezes opera sem consideração pelo precedente nacional.
Trump elogiou os líderes autoritários de China, Coreia do Norte e Rússia, enquanto depreciava aliados democráticos americanos na Europa e na Ásia. Se os EUA permanecerão parte da Otan é uma questão em aberto. A ajuda à Ucrânia, enquanto ela luta para combater a invasão da Rússia, está em perigo. E o conflito no Oriente Médio terá um novo ator poderoso e imprevisível.
Há ainda questões domésticas que mudarão drasticamente. Trump fez campanha com slogans como “deportem ilegais agora”. Ele prometeu uma tarifa de 20% sobre mercadorias importadas. Seus aliados disseram que um governo Trump poderia restringir severamente ou tentar proibir o aborto.
* Força política mais duradoura
Trump enfrentou dúvidas sobre se seu apoio tinha um limite máximo. Mas, na terça (5), ele ultrapassou 50% em vários Estados decisivos. Kamala Harris disse repetidamente que sua campanha foi projetada para “virar a página” da era Trump.
Agora, a história de Trump pode ter mais anos pela frente. Enquanto o partido do ex-presidente perdeu ou teve desempenho inferior em todas as eleições importantes desde que ele venceu, em 2016, ele permaneceu a força mais poderosa na política americana.
Trump foi indiciado criminalmente quatro vezes e condenado uma vez. Foi considerado responsável por agressão sexual, mentiu o suficiente para manter um exército de verificadores de fatos empregados e passou os últimos dias de sua campanha dando palco para piadas racistas e usando linguagem ameaçadora contra seus oponentes políticos. Os americanos ignoraram tudo isso.
* Kamala não conseguiu se distanciar de Joe Biden
A vice-presidente, Kamala Harris, conduziu uma campanha disciplinada e livre de controvérsias, mas lutou para se distanciar do governo impopular de Joe Biden, no qual ela desempenhou um papel de liderança importante.
As recriminações pelo fraco desempenho de Kamala serão rápidas para o presidente Biden, que, apesar de suas conquistas legislativas, permaneceu impopular com os eleitores. Os americanos o consideraram muito velho para um segundo mandato e o viram como um administrador fraco na economia e na questão migratória.
* EUA continuarão esperando por uma presidente mulher
Hillary Clinton fez da perspectiva de quebrar o que ela uma vez chamou de “o teto de vidro mais alto e mais difícil” um ponto central de sua campanha de 2016.
Kamala não fez do seu gênero ou da sua raça – ela é filha de um pai jamaicano e de uma mãe indiana – um tema central de sua campanha abreviada, enquanto buscava desqualificar Trump e se apresentar como a face de uma nova geração de liderança nos EUA. As abordagens não funcionaram.
* Julgamentos criminais de Trump estão em perigo
O Departamento de Justiça de Trump, provavelmente, arquivará as acusações federais contra ele nos casos de documentos secretos e interferência nas eleições de 2020. Ele já disse que demitirá Jack Smith, o procurador especial que liderou as investigações e processos federais contra ele nos últimos dois anos. Não há muita dúvida de que um secretário de Justiça nomeado por Trump engavetaria as acusações logo após ser confirmado no cargo. (O Estado de S. Paulo)