O artigo 142 da Constituição Federal trata do papel das Forças Armadas na ordem constitucional, ou seja, o que elas são e quais são suas atribuições.
A redação do dispositivo estabelece que “a Marinha, o Exército e a Aeronáutica são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República”. Pelo texto, “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes da lei e da ordem”.
É consenso entre juristas que o dispositivo não legitima ou sustenta uma
intervenção militar em algum dos Poderes da República ou como poder moderador em caso de conflito entre eles. Um Poder não pode, segundo a interpretação majoritária do artigo, pedir que as Forças Armadas interfiram em outro porque isso violaria o princípio da separação dos Poderes, cláusula pétrea da Constituição.
Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) voltaram a citar o artigo após a vitória de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas urnas no último domingo (30). Pelo menos desde 2020, em momentos de maior acirramento político, bolsonaristas tentam emplacar uma leitura do artigo no sentido de que as Forças Armadas teriam poder para moderar conflito entre os Poderes e fechar o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Naquele ano, o próprio Bolsonaro defendeu essa “tese” durante uma reunião
ministerial. “Nós queremos fazer cumprir o artigo 142 da Constituição. Todo mundo quer fazer cumprir o artigo 142 da Constituição. E, havendo necessidade, qualquer dos Poderes pode, né? Pedir às Forças Armadas que intervenham para restabelecer a ordem no Brasil”, disse.
Enquanto presidente do STF, o ministro Luiz Fux concedeu uma liminar em junho de 2020 declarando que os militares não exercem poder moderador em eventual conflito entre o Executivo, Legislativo e Judiciário. A decisão foi tomada em uma ação em que o PDT pediu para a Corte esclarecer as atribuições dos militares, de acordo com a Constituição Federal.
“Confiar essa missão às Forças Armadas violaria a cláusula pétrea da separação de poderes, atribuindo-lhes, em último grau e na prática, inclusive o poder de resolver até mesmo conflitos interpretativos sobre normas da Constituição”, afirmou Fux, na decisão.
A Secretaria-Geral da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados, em meados de
2020, emitiu parecer em que rechaça a interpretação de que o arbitramento de
conflito entre os Poderes seria atribuição das Forças Armadas.
“Jamais caberá ao presidente da República, nos marcos da Constituição vigente, convocar as Forças Armadas para que indiquem ao Supremo Tribunal Federal qual é a interpretação correta do texto constitucional diante de uma
eventual controvérsia entre ambos”, diz o parecer.