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Saiba o que é o divórcio instantâneo pelo WhatsApp na Índia, que poderá ser punido com cadeia

Divórcio chegou ao WhatsApp. (Foto: Reprodução)

A indiana Afreen Rehman tinha um emprego com um excelente salário e um MBA quando decidiu se casar. A cerimônia luxuosa foi na cidade de Jaipur, a 260 km da capital do país, Nova Délhi. Pouco depois, Rehman parou de trabalhar, a pedido do agora ex-marido.

“Queria que o casamento funcionasse, então concordei”, disse ela. “Mas não funcionou. Ele fazia pedidos constantes de dotes, e tinha surtos de violência. Entrei em depressão”, conta Rehman.

Em menos de um ano, ela recebeu um pedido para a deixar a casa do marido, e foi morar com a mãe.

Para piorar, Rehman se feriu gravemente em um acidente de carro, meses depois. Enquanto se recuperava, recebeu um bilhete do esposo com as palavras “talaq, talaq, talaq”.

O bilhete recebido por Rehman é parte de uma tradição do Islã que, hoje em dia, só existe praticamente na Índia.

O “triplo talaq” permite aos homens muçulmanos se divorciar de suas esposas em minutos, simplesmente repetindo as palavras “talaq, talaq, talaq”.

A decisão é unilateral, sem consulta à mulher. E pode ser feita tanto oralmente quanto por e-mail e até mesmo mensagens de texto, em aplicativos como o WhatsApp.

Uma prima de Rehman, ativista dos direitos das mulheres, a convenceu a entrar com um pedido na Justiça indiana para anular o “divórcio instantâneo”, além de apresentar queixas sobre o assédio e a violência doméstica a que era submetida.

O marido e a sogra negam as acusações. Em meados deste ano, eles foram presos e liberados quatro dias depois, após pagar fiança.

“Vou carregar o estigma por toda a minha vida, pois, na Índia, a mulher é sempre considerada culpada pelo divórcio”, diz Rehman.

“Não quero voltar para o meu marido; não é por isso que estou travando esta luta judicial. Luto por justiça e para garantir que outras mulheres não sejam tratadas dessa forma”, disse ela à reportagem.

A Suprema Corte da Índia considerou a petição de Rehman e de outras quatro mulheres em uma decisão de agosto, que considerou o “divórcio instantâneo” inconstitucional.

A prática do “triplo Talaq” só permanece hoje na Índia, e não tem respaldo no Corão e nem na sharia, a lei islâmica.

Segundo estudiosos do Islã, o Corão inclusive determina que o divórcio dure pelo menos três meses, para que o casal possa refletir e, eventualmente, se reconciliar. Outros países muçulmanos, como o Paquistão, já baniram a prática.

Proibição e cadeia

Apesar da decisão de agosto da Suprema Corte, a prática continuou ocorrendo na comunidade islâmica indiana, segundo as autoridades locais.

Por isso, o “triplo talaq” agora é alvo de um projeto de lei que está sendo estudado em Nova Délhi.

Pela nova lei, a prática poderá ser punida com até três anos de prisão.

Segundo a mídia indiana, a legislação pode ser votada pelo Parlamento já em meados de dezembro.

O projeto de lei em estudo também propõe multas e medidas de amparo para as mulheres atingidas. O projeto, que está sendo chamado de “Lei de Proteção aos Direitos das Mulheres Muçulmanas no Casamento”, foi enviado aos governos regionais da Índia para consultas.

Assim como a decisão da Suprema Corte, o projeto proíbe de forma explícita o “triplo talaq”, além de criar uma “bolsa de subsistência” para as mulheres atingidas, segundo a principal agência de notícias da Índia, a Press Trust.

O que é o Triplo Talaq?

Os muçulmanos são a maior minoria religiosa da índia, com uma população estimada em 155 milhões. Seus casamentos são regidos por uma versão particular da lei islâmica, presumivelmente baseada na sharia.

Apesar de ser praticado há décadas, o “triplo talaq” unilateral é claramente uma aberração – não é mencionado nem no Corão nem na sharia.

Estudiosos do Islã dizem que o Corão estabelece claramente como deve ser um divórcio. Deve ser consumado ao longo de três meses, o que permitiria ao casal refletir e eventualmente se reconciliar.

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