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Saiba por que Bolsonaro enfrentará um Congresso ainda mais poderoso em 2020

Na avaliação da cúpula do Congresso, Heleno e Guedes insuflam o presidente Jair Bolsonaro contra os parlamentares. (Foto: Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

O governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) terá de lidar com um Congresso ainda mais forte a partir do dia 4 de fevereiro, quando deputados e senadores voltam das férias.

A nova regra do Orçamento Impositivo que começou a valer em 2020 significa mais poder dos congressistas sobre a aplicação do dinheiro público — e menos margem de negociação para o Executivo na liberação das emendas parlamentares. As mudanças foram aprovadas em meados do ano passado, mas só começam a valer este ano.

No novo modelo, o Executivo é obrigado a pagar também as emendas de bancada de deputados e senadores — e o montante total chega a R$ 15,4 bilhões.

Além disso, o presidente também terá que enfrentar as consequências do “racha” de seu antigo partido, o PSL, e de não ter construído uma base de apoio no Congresso ao longo do seu primeiro ano de mandato.

2020 será ainda um ano mais curto na política — por causa das eleições municipais de outubro, deputados e senadores costumam diminuir o ritmo do trabalho no segundo semestre. Também ficam menos dispostos a votar pautas consideradas “negativas”, que possam prejudicar seu desempenho nas urnas.

Orçamento cada vez mais nas mãos do Congresso

As emendas parlamentares são pequenas modificações que os congressistas fazem ao Orçamento, determinando como deve ser gasto o dinheiro público. Normalmente são apresentadas em outubro, para o orçamento do ano seguinte.

Os políticos costumam destinar este dinheiro a projetos nos locais onde vivem seus eleitores. Emendas podem ser usadas para obras de infraestrutura, como a pavimentação de uma rua; ou para custear o funcionamento de serviços de saúde, entre outras finalidades.

Em 2020, as novas regras do chamado Orçamento Impositivo obrigarão o Executivo a pagar não só as emendas individuais dos deputados e senadores (o que já acontece desde 2014), mas também as emendas das bancadas dos Estados.

Até 2019, essas modificações ao Orçamento poderiam ou não ser pagas — e frequentemente não eram. Agora, o pagamento da maior parte desse valor passa a ser obrigatório.

O Orçamento deste ano traz R$ 15,4 bilhões em emendas obrigatórias, entre individuais (R$ 9,5 bilhões) e de bancadas (R$ 5,9 bilhões).

Ou seja: se o bolo fosse dividido igualmente entre os 513 deputados e os 81 senadores, cada um deles teria algo como R$ 25,9 milhões em emendas obrigatórias para o ano de 2020.

Na prática, porém, a divisão não é tão exata. Cada bancada estadual usa um critério diferente para dividir o bolo das emendas de bancada, diz o consultor de orçamento da Câmara dos Deputados Hélio Tollini. Ele é autor de alguns estudos sobre o Orçamento Impositivo.

Os R$ 15,4 bilhões das emendas obrigatórias se tornam ainda mais importantes em um ano como 2020 — no qual a margem de gastos “livres” do Executivo está muito reduzida, diz Tollini.

De R$ 3,6 trilhões do Orçamento da União para 2020, apenas R$ 135,9 bilhões (ou 3,6%) são de gastos liberados (“discricionários”, no jargão orçamentário). E é justamente desta fatia que vão sair as emendas de deputados e senadores.

O resto do dinheiro está comprometido com transferências para Estados e municípios; pagamento de aposentadorias, juros da dívida e salários de servidores.

Tollini explica ainda que, pela regra do teto de gastos, o crescimento do gasto com uma área (como as emendas) terá de significar a redução em outras. O teto de gastos é uma norma constitucional criada em 2016 no mandato do ex-presidente Michel Temer (MDB), segundo a qual os gastos totais do governo não podem aumentar — apenas acompanhar a inflação.

“O que está sendo disputado agora é a composição da despesa. Quando o Legislativo transforma as suas despesas (com emendas) em gastos obrigatórios, ele ocupa espaço (fiscal). Resta ao Executivo tentar baixar as suas”, diz Tollini — ele ressaltou que fala por si, e não em nome da Consultoria de Orçamento (Conof) da Câmara.

O senador Esperidião Amin (PP-SC) foi o relator, no Senado, de uma das duas PECs aprovadas em 2019 e que alteraram o Orçamento Impositivo.

Segundo ele, o Congresso está ocupando espaço no Orçamento de forma “lenta, gradual e segura”. “Na verdade, nós estamos adotando o Orçamento Impositivo gradualmente”, diz Amin à BBC News Brasil.

No ano que vem, o percentual das emendas “obrigatórias” de bancada subirá novamente, de acordo com as mudanças aprovadas em 2019.

O objetivo final, diz Amin, é tornar todo o Orçamento impositivo.

Hoje, o Orçamento brasileiro tem caráter “autorizativo”: a lei aprovada pelo Congresso a cada ano autoriza os gastos, que podem ou não acontecer, conforme decisão do Executivo. No futuro, o Orçamento poderá ser “prescritivo”: tudo que foi aprovado deverá ser pago, e o governo só poderá modificar o Orçamento com o aval do Congresso, diz Amin.

“Acho que estamos evoluindo neste sentido, e acho que numa velocidade ainda maior do que eu imaginava de início. Não será surpresa para mim se o Orçamento se tornar totalmente impositivo até o fim do governo Bolsonaro”, diz o senador.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também falou sobre as novas regras do Orçamento Impositivo em um café com jornalistas, no fim de dezembro.

“O orçamento impositivo existe no mundo inteiro (…). E no mundo inteiro o espaço do Congresso (na elaboração do orçamento) é muito forte mesmo. E é pra ser forte”, disse Maia na ocasião.

Bolsonaro terá ano complicado, dizem especialistas

Em 2019, Bolsonaro colheu resultados contraditórios em sua relação com o Congresso.

Por um lado, saiu vitorioso em sua principal pauta econômica do período, a reforma da Previdência. Por outro, fechou o ano passado como o presidente que menos conseguiu aprovar medidas provisórias enviadas ao Congresso desde 2001, de acordo com levantamento do site especializado Poder360.

Também teve quase 30% dos seus vetos a projetos de lei revistos — o número total é maior que a soma do ocorrido nos governos de Fernando Henrique (PSDB) e dos petistas Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, segundo mapeou o jornal O Estado de S. Paulo.

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