Domingo, 05 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 29 de setembro de 2018
Na última quarta-feira, os governos da Argentina, Chile, Colômbia, Paraguai, Peru e Canadá pediram ao TPI (Tribunal Penal Internacional) que investigue supostos crimes contra a humanidade e abusos aos direitos humanos ocorridos na Venezuela desde 12 de abril de 2014 sob o governo de Nicolás Maduro.
No dia seguinte, os seis países motivaram também a apresentação de uma resolução no Conselho de Direitos Humanos da ONU (Organização das Nações Unidas) que pedia a cooperação da Venezuela nos esforços para aplacar a crise humanitária no país. Ela foi aprovada por 23 países, incluindo o Brasil (outros sete países foram contrários, e 17 se abstiveram).
Mas, se votou pela aprovação da resolução, por que o Brasil não se juntou ao grupo de países que protagonizou as ações, uma vez que é uma potência regional e já liderou iniciativas marcantes que questionaram o regime de Maduro?
“É difícil precisar porque algo não aconteceu. Mas uma das questões que me permite imaginar esta ausência é que o Brasil parece estar adotando uma postura menos frontal, de descompressão da animosidade. Estamos com um problema sério na fronteira, que vem afetando o fornecimento de energia e o fluxo migratório”, aponta Leandro Consentino, especialista em relações internacionais do instituto Insper, de São Paulo.
Consentino exemplifica esta sinalização menos incisiva com o encontro, planejado para esta sexta-feira, entre os ministros das Relações Exteriores do Brasil e da Venezuela – Aloysio Nunes e Jorge Arreaza. A reunião sucede um hiato de reuniões entre chanceleres desde que as relações diplomáticas entre os dois países foram suspensas temporariamente em dezembro – quando o embaixador brasileiro em Caracas foi expulso e tratado como “persona non grata”.
O regime de Maduro justificou a decisão comentando fatos da política interna brasileira, como o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff. Em relação à crise humanitária e política da Venezuela, o Brasil protagonizou acusações frequentes em plenárias da OEA (Organização dos Estados Americanos).
Em 2016, o Brasil, em conjunto com outros países, liderou a aprovação da suspensão da Venezuela, por tempo indeterminado, do Mercosul. Um novo bloqueio do tipo foi aprovado no bloco novamente em 2017. Mas, em entrevista à imprensa, Nunes optou por um tom moderado e afirmou nesta quinta-feira que “não há hostilidade” entre os países.
“Temos relações diplomáticas e não há razão para negar os encontros (como o com Jorge Arreaza). Temos uma fronteira bastante extensa, uma comunidade brasileira importante morando lá, três consulados, uma imigração sem uma dimensão dramática como a que existe em direção a outros países”, afirmou o chanceler brasileiro.
Consentino aponta que a suspensão do Mercosul foi uma sinalização forte enviada pelo Brasil, que no entanto pode estar agora apostando mais no diálogo. “Hoje o tom é mais brando. Talvez justamente para que a política não contamine as trocas comerciais e outras negociações”, aponta o pesquisador do Insper.
Multilateralismo
Oliver Stuenkel, professor adjunto de Relações Internacionais na FGV (Fundação Getúlio Vargas), concorda que o Brasil tem preferido o caminho do multilateralismo em fóruns regionais em detrimento de ações como a que recorreu ao Tribunal Penal Internacional.
“O Brasil está no Grupo de Lima (organização criada em 2017 para buscar soluções para a crise venezuelana) e tem condenado com frequência violações no país. A estratégia tem sido como a de outros países da região, de condenar, nos fóruns internacionais, a ruptura democrática, mas sem impor sanções”, aponta Stuenkel.
“O mais importante é que, apesar de todos estes avanços institucionais, a América Latina não conseguiu impactar de maneira eficaz na situação venezuelana. Ao meu ver, hoje, qualquer atuação será de natureza paliativa. Hoje não vejo ninguém com capacidade de reiniciar um diálogo positivamente.”
Uma fonte que preferiu não se identificar apontou ainda que a diplomacia brasileira decidiu não se juntar aos seis países que recorreram ao TPI por avaliar que, caso a acusação contra Maduro avance no tribunal, uma condenação o impediria de sair do país – sob o risco eventual de ser preso nos países signatários do Estatuto de Roma, em que a corte tem jurisdição. Assim, estaria afastada uma solução para a crise venezuelana que pudesse envolver a remoção de Maduro – algo conhecido como uma “saída honrosa”.