Estima-se que em 2019 havia 2,46 milhões de pessoas com 60 anos ou mais vivendo com demência no Brasil. Esse número deve subir exponencialmente nos próximos anos e atingir 5,05 milhões, em 2039, e 8,74 milhões, em 2049. E cerca de 80% dos pacientes não são diagnosticados.
Os dados são do Relatório Nacional sobre a Demência (Renade), que foi divulgado ontem, fruto de uma parceria entre o Ministério da Saúde e a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).
De acordo com relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS), acredita-se que, em 2019, 55,2 milhões de pessoas no mundo viviam com demência. A estimativa é que o número suba para 78 milhões, em 2030, e 139 milhões, em 2050. Essas previsões, contudo, desconsideram mudanças nas taxas de prevalência específicas por idade.
A demência é uma síndrome marcada pelo declínio da função cognitiva (capacidade de processamento do pensamento) e pela perda da autonomia. Ela pode ser causada por uma série de doenças – por vezes, mais de uma ao mesmo tempo (demência mista) –, sendo a principal o Alzheimer.
Os dados apresentados ontem são parte de um “esforço emergencial”. O objetivo é dar alguma previsibilidade a gestores públicos e profissionais da saúde sobre a dimensão da demência no País, num momento de veloz transição demográfica, marcada pelo envelhecimento populacional.
“Nós temos 30 milhões de pessoas com 60 anos ou mais no Brasil, de acordo com o último Censo, o que corresponde a 15% da população brasileira”, lembrou a coordenadora do Renade Cleusa Ferri, psiquiatra, epidemiologista e professora da Unifesp, no evento de lançamento do relatório, em Brasília. “A população acima de 60 anos cresceu nove vezes mais do que a geral.”
De acordo com o consenso, a prevalência média de demência na população brasileira com 60 anos ou mais correspondeu a 8,5% em 2019, sendo 9,1% entre as mulheres e 7,7% entre os homens. A prevalência aumenta com a idade. Segundo o relatório, ela é de 2% na faixa dos 60 aos 64 anos, e passa para 43% na faixa de 90 anos ou mais.
Todos esses dados, no entanto, são estimativas, fruto de um consenso de 15 especialistas reunidos pelo ministério e pela Unifesp. Eles foram providos dos principais estudos sobre prevalência da demência no Brasil – muitos com dados apenas do Sudeste – e, em várias rodadas, estimaram qual seria o cenário nacional.
A técnica utilizada, chamada método Delphi, já foi usada para levantamentos sobre demência em outros países e, embora importante, possui limitações. “Os dados disponíveis não espelham a fotografia real da situação da demência no País”, alerta o próprio relatório. “O consenso não substitui a evidência. Ele é um valor provisório. Precisamos de dados melhores para chegar ao número mais provável de pessoas com demência no País”, ressaltou Cleusa.
O relatório traz o primeiro estudo com estimativas de subdiagnóstico de demência para todo o Brasil. Isto é, a porcentagem de pessoas que, embora apresentem a síndrome, não receberam diagnóstico médico.
No cenário mais otimista, essa prevalência é de 80,2%. No mais pessimista, 88,7%, bem acima de outras localidades. No mundo, segundo estudos, as taxas podem chegar a 53,7% na Europa, 62,9% na América do Norte e 93,2% na Ásia.
De acordo com o relatório, o cenário é desigual no País. “A Região Norte apresenta a maior porcentagem de pessoas com demência não diagnosticadas, seguida pelo Nordeste e Centro-Oeste. Já as menores taxas parecem ocorrer no Sudeste, seguido pela Região Sul”, diz o documento.
“O diagnóstico precoce e correto de demência permite um manejo terapêutico adequado, pode ajudar a melhorar o prognóstico (do paciente) e, certamente, pode contribuir para diminuir a sobrecarga de familiares e cuidadores”, afirmou o neurologista Paulo Caramelli, professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), durante o evento.
Ainda de acordo com Cleusa, não existe dúvida de que, no cenário atual, a melhor forma de diminuir a carga da demência nas gerações futuras é a prevenção, com foco nos fatores de risco modificáveis.
“Em estudos feitos em outros países, nos quais há uma diminuição da incidência da demência, ela tem sido atribuída muito a uma melhora substancial do controle, tratamento e cuidado das doenças cardiovasculares, e da escolaridade. Se atuarmos bem nesses fatores, podemos fazer muito pelas gerações futuras”, diz a coordenadora do Renade. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.