Segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 9 de fevereiro de 2025
A “síndrome da tarefeira” ainda impacta profissionais em diferentes momentos da carreira. O termo se refere a mulheres líderes que se sentem “obrigadas” a acumular múltiplas responsabilidades e executam diversas tarefas ao mesmo tempo. Um dos principais efeitos desse comportamento é a falta de direcionamento profissional: apesar de estarem sempre ocupadas, muitas acabam sem um foco para a carreira no longo prazo. A questão é abordada no livro Quebre o Teto de Vidro, de Karinna Bidermann Forlenza, que discute por que é mais difícil para as mulheres atingirem o topo da carreira.
Segundo a autora, “99% das mulheres com quem converso acreditam piamente que um bom trabalho fala por si só” e esperam reconhecimento apenas por seu desempenho, mesmo nos cargos mais altos. O problema é que no alto escalão outras habilidades se tornam essenciais, como pensar estrategicamente e saber fazer política.
A mentora de carreiras Raquel Christoff explica que, além do acúmulo de tarefas, há sinais claros que indicam a síndrome de tarefeira, como a dificuldade em delegar, a pressão para atender expectativas externas e o desgaste emocional e físico.
Rebecca Fischer, de 34 anos, cofundadora da fintech de pagamentos Divibank, percebeu que estava enfrentando o problema em dois momentos da carreira. O primeiro enquanto era diretora de contas de uma empresa em que atuou.
A situação mais recente foi um verdadeiro teste de limites, relembra a empreendedora, pois tinha de executar inúmeras funções sem deixar a gestão do atual negócio de lado. Além disso, a demanda da vida pessoal intensificou a sensação de esgotamento.
Para Rebecca, o fenômeno não é algo que simplesmente desapareceu da rotina. Na verdade, considera que o problema retornou em diferentes fases da vida. “Não basta reparar a síndrome uma vez, ligar uma luz e estar curada para sempre. Muitas vezes você pode voltar a entrar em ciclos e não ter muita escolha, não ter o que fazer mesmo porque tem muita tarefa para realizar”, diz Rebeca.
Segundo Raquel, o problema surge da crença de que, quanto mais atividades realizadas, maiores as chances de alcançar objetivos, como promoções e reconhecimento no trabalho. No entanto, o efeito é reverso e acaba gerando sobrecarga, frustração e impacto na saúde mental.
“A síndrome da tarefeira vem de gerações anteriores, em que as mulheres eram culturalmente estimuladas a assumir a liderança em casa e no trabalho, sem dividir tarefas. Então, a mulher acredita que, quanto mais responsabilidades tiver, maior a chance de alcançar o que deseja. Isso traz sobrecarga porque não há clareza de quais daquelas atividades vão dar resultado”, afirma Raquel.
Há também o machismo estrutural, diz a mentora, acrescentando que as mulheres sentem que precisam se provar mais que seus colegas homens para conquistar o mesmo reconhecimento.
Foi exatamente por causa da falta de estratégia que Eduarda Camargo, de 31 anos, Chief Growth Officer da fintech Portão 3, se viu afundada em tarefas sem propósito para a carreira. Em um cargo de liderança há quase seis anos, ela diz ter assumido inúmeras responsabilidades em um período curto, o que a levou a acumular tarefas e a centralizar decisões. “Como virei líder muito rápido e com pouco recurso, achava que precisava saber e controlar tudo. Muitas vezes sufocava o time. Eu não era estratégica”, comenta.
Segundo a executiva, o surgimento de problemas de saúde com frequência foi o momento mais crítico. Outro reflexo da sobrecarga apareceu na equipe: alta rotatividade, falta de direcionamento claro e baixos resultados. O ponto de virada veio quando a liderança direta de Eduarda apontou que ela não precisava saber e fazer tudo, mas sim delegar e confiar no time. Mas o processo de mudança não foi imediato. “Não vou dizer que foi de um dia para o outro, tive muita dificuldade.” (Estadão Conteúdo)