Sexta-feira, 27 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 14 de março de 2024
O suposto crime em questão foi denunciado pela mãe da menina.
Foto: Marcello Casal Jr./Agência BrasilOs ministros da 5ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiram que não houve estupro de vulnerável na relação entre um homem de 20 anos e uma menina de 12. A relação resultou em uma gravidez. O placar foi de 3 votos a favor dessa tese e 2 contrários.
“O que vai acontecer é que os coronéis desse País vão misteriosamente se apaixonar pelas meninas de 12 anos. Essa será a principal excludente de ilicitude em todos os casos de estupro de vulnerável”, alertou a ministra Daniela Teixeira em seu voto.
“Uma criança de 12 anos não tem capacidade intelectual ou emocional para consentir com o ato sexual”, frisou a magistrada.
Única mulher da turma, ela foi acompanhada pelo ministro Messod Azulay Neto, que concordou com o posicionamento da colega de que o Poder Judiciário não pode transigir com o que a lei traçou como um “standard de civilidade”: o marco absoluto de 14 anos de idade para definir o estupro de vulnerável.
Os dois foram votos vencidos. De acordo com a decisão, em casos excepcionalíssimos, em que se comprove a ausência de relevância social do ato, é possível afastar a presunção do crime de estupro de vulnerável nas relações sexuais com pessoa menor de 14 anos.
O suposto crime em questão foi denunciado pela mãe da menina, mas afastado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) porque houve união estável e, embora o casal não esteja mais junto, mantém relações por causa da criança, que é apoiada pelo pai.
Ao analisar o caso, a corte estadual entendeu que houve o chamado erro de proibição: quando uma pessoa comete um crime supondo que essa conduta é legal ou legítima. O Ministério Público de Minas Gerais recorreu então ao STJ buscando restaurar a condenação.
A 5ª turma entendeu que rever essa conclusão demandaria reanálise de fatos e provas, medida vedada em sede de recurso especial. O resultado representa uma reafirmação de jurisprudência.
Em seu voto, o relator Reynaldo Soares da Fonseca enfatizou que uma criança com menos de 14 anos, de fato, não está em condições de ter um relacionamento amoroso, pois deve dedicar-se ao seu desenvolvimento educacional e lúdico.
Contudo, também ponderou que a vida transcende as leis e que a antecipação da fase adulta não deve causar mais danos, especialmente à criança gerada nessa união, que merece proteção absoluta.
“Estamos aqui aplicando a jurisprudência, cuja exceção confirma a regra”, justificou o ministro. Seguiram o relator os ministros Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik.
Como o processo envolve uma menor de idade, os nomes do réu e da vítima não foram divulgados.
Lei
O Artigo 217-A do Código Penal prevê que qualquer relação sexual com menor de 14 anos é crime. O próprio STJ possui uma súmula jurisprudencial, aprovada em 2017, para confirmar que o estupro ocorre mesmo se houver consentimento da vítima e independentemente de seu passado sexual.
Não é a primeira vez que a Justiça afasta o crime de estupro em situações específicas, havendo casos excepcionais na jurisprudência.
Veja a nota do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG):
“O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) acompanhou a sessão de julgamento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que confirmou a absolvição de um homem acusado de manter relações sexuais com uma menina de 12 anos. Entretanto, de maneira respeitosa, acredita que a decisão se desviou da jurisprudência consolidada pela Corte em 2017, que inclusive foi acolhida pelo legislador em 2018, ao editar a Lei n. 13.718, confirmando que é criminosa a conduta de manter relações sexuais com menores de 14 anos, mesmo que sejam consentidas pela vítima.
O MPMG aguarda a disponibilização dos votos para recorrer da decisão na própria Corte, bem como analisa a propositura de reclamação no Supremo Tribunal Federal para reafirmar a constitucionalidade da lei que prevê tais condutas como criminosas.
Em paralelo, o MPMG, a partir de dois recursos de Minas Gerais, indicados como candidatos a representativos da controvérsia, buscará junto ao STJ para que seja reafirmada a vulnerabilidade absoluta das vítimas de crimes sexuais que tenham menos de 14 anos.”