Os impactos dos sites de apostas no Brasil serão tema de audiência pública no Supremo Tribunal Federal (STF), nos dias 11 e 12 de novembro. O encontro tem como objetivo ouvir membros do Poder Público e da sociedade civil, com conhecimentos técnicos e jurídicos sobre temas relacionados às bets.
Os debates foram divididos em dois dias, com quatro blocos, para atender aos mais de 100 pedidos de inscrição para participação na audiência. Representantes do governo, de instituições públicas e privadas, advogados, acadêmicos e clubes de futebol discutirão as consequências sociais e econômicas das apostas esportivas e dos jogos de azar.
Dado mundial
Os danos dos jogos de azar são mais substanciais e abrangentes do que se imaginava, mostra o relatório de uma comissão de especialistas reunidos pela revista científica The Lancet Public Health. Eles buscaram estimativas globais do impacto do jogo de azar na saúde pública e estimaram que aproximadamente 448,7 milhões de adultos em todo o mundo experimentam algum risco (any risk gambling, em inglês).
Pessoas nessa categoria enfrentam pelo menos um sintoma comportamental ou consequência pessoal, social ou de saúde adversa do jogo de azar, sem necessariamente completar os requisitos diagnósticos para transtorno do jogo. Desses, 80 milhões possuem transtorno do jogo, reconhecido em manuais de psiquiatria e descrito como um padrão de apostas repetidas e que continuam apesar de criar múltiplos problemas em várias áreas da vida.
De acordo com os pesquisadores, esses danos incluem problemas de saúde física e mental, ruptura de relacionamentos, aumento do risco de suicídio e violência doméstica – tanto de ser o agressor, quanto de ser a vítima –, aumento da criminalidade, perda de emprego e prejuízos financeiros.
E eles não se restringem ao apostador em si. Pelo menos seis outras pessoas, em média, são negativamente afetadas por um indivíduo com transtorno do jogo.
E os pesquisadores destacam que essas estimativas são conservadoras, já que muitos países não têm sequer dados sobre o assunto. É por isso que o relatório pede aos governos, que cada vez mais têm legalizado os jogos de azar, que assumam o compromisso de financiar estudos e fornecer dados.
“Um sistema de monitoramento sofisticado teria métricas integradas de diversas fontes. Por exemplo, teríamos dados de sistemas de saúde sobre o número de pessoas que procuram apoio por danos relacionados ao jogo; dados rotineiros sobre o quanto o jogo está implicado em suicídios; dados do sistema de Justiça sobre se o jogo é um fator entre aqueles envolvidos no sistema de Justiça criminal”, afirma Heather Wardle, professora da Universidade de Glasgow, na Escócia, e uma das autoras do relatório da Lancet, publicado em 24 de outubro. “Também seria necessário um mecanismo para acessar dados da indústria de forma independente, sem que ela tenha influência sobre quais pesquisas são realizadas”, disse.
“A necessidade de mais pesquisas pode ser explorada pela indústria para fins táticos, principalmente para atrasar a ação. Os atores da saúde pública precisam aprimorar o próprio manual para combater essa tática”, alerta Antonio Carlos Cruz Freire, professor do departamento de Neurociências e Saúde Mental da Universidade Federal da Bahia (UFBA).