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Por Redação O Sul | 11 de junho de 2015
Por unanimidade, o STF (Supremo Tribunal Federal) liberou nessa quarta-feira (10) a publicação de biografias não autorizadas. Os ministros consideraram inconstitucional a aplicação para livros biográficos de dois artigos do Código Civil segundo os quais sem autorização prévia do retratado ou de seus familiares, no caso de personalidades mortas, escritos sobre pessoas com fins comerciais poderiam ser proibidos.
Para o tribunal, a exigência representaria uma censura, que é incompatível com a Constituição, que garante a liberdade de expressão. A corte entende que eventuais distorções podem ser discutidas na Justiça posteriormente, uma vez que a legislação já garante medidas reparadoras como indenizações e direito de resposta.
A polêmica sobre a publicação de biografias não autorizada se estende há anos e encontra resistência em setores das classes artística e política, que resistem em ter suas histórias expostas. Em 2012, a Anel (Associação Nacional dos Editores de Livros) questionou no STF a legalidade da proibição de utilização da imagem ou outra forma de exposição da pessoa “salvo se autorizadas” e, ainda, a determinação de que “a vida privada da pessoa natural é inviolável”.
Votaram pela liberação das biografias os ministros Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Relatora do caso, Cármen Lúcia considerou que o direito à ampla liberdade de expressão não pode ser suprimido pelo direito das pessoas públicas à privacidade e intimidade. “Censura é forma de cala-boca. Pior, de calar a Constituição. O que não me parece constitucionalmente admissível é o esquartejamento da liberdade de todos em detrimento da liberdade de um.”
A ministra reconheceu o risco de abusos e distorções, mas ponderou que quem se sentir violado tem direito de recorrer ao Judiciário, para garantir eventuais correções e sanções. “Há risco de abusos, não somente no dizer e no escrever. Mas a vida é uma experiência de riscos”, considerou. “O que não admite a Constituição do Brasil é que sob o argumento de ter direito a ter trancada a sua porta, abolir-se a liberdade do outro de se expressar, de pensar, de criar obras literárias, especialmente, no caso, obras biográficas, que dizem respeito não apenas ao biografado, mas que diz respeito à toda a coletividade”.
As eventuais reparações em distorções presentes em biografias gerou discussão. Um trecho do voto de Cármen Lúcia estabelecendo que eventuais transgressões serão reparadas com indenização foi questionado. Gilmar Mendes afirmou que a expressão poderia deixar a interpretação de que apenas caberia indenizações nesses casos. A ministra alterou o voto para deixar claro que o acesso à Justiça aos biografados inclui além de indenização outros instrumentos, como direito de resposta.
Os ministros fizeram duras críticas à necessidade de autorização dos biografados. Luís Roberto Barroso afirmou que a censura prévia é vedada pela Constituição. O ministro disse que não deve existir hierarquia entre os direitos essenciais, mas que a liberdade de expressão deve ser preferencial, uma vez que já foi alvo de violações no passado. “A liberdade de expressão não é garantia de verdade nem de Justiça, é garantia da democracia”, ressaltou o ministro.
Celso de Mello afirmou que os juízes não podem transformar seu poder em instrumento de censura estatal. Para ele, a censura foi banida da legislação brasileira.
Luiz Fux declarou que pessoas públicas pagam o preço da notoriedade, sendo que sua privacidade é diminuída com a fama. O ministro Gilmar Mendes considerou que a autorização prévia para biografias “traz dano para a liberdade de comunicação, científica e artística”.
Dias Toffoli disse que o julgamento se tratava da intimidade das pessoas e que o entendimento do tribunal não representava uma garantia à liberdade absoluta para uso da imagem das pessoas. Rosa Weber considerou que “a autorização prévia constitui uma forma de censura prévia que é incompatível com nosso Estado de Direito”.
Entidades
No julgamento, entidades que representavam escritores e pesquisadores, além da Ordem dos Advogados do Brasil, argumentaram que a autorização representava censura. Representante da Anel, o advogado Gustavo Binenbojm afirmou que a exigência de autorização prévia é uma forma privada de censura e fere a Constituição, uma vez que desrespeita o direito de expressão do autor, especialmente em relação a figuras públicas. Advogado para o Instituto Amigo, ligado ao cantor Roberto Carlos, Antônio Carlos de Almeida Castro sustentou que a intimidade e informação são dois direitos com igual status constitucional. (Márcio Falcão/Folhapress e STF)