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Tecnologia de vacina contra a covid é usada com sucesso como antirrugas nos Estados Unidos

Embora só tenha sido testado em animais, o método foi considerado promissor e abre caminho para novas aplicações médicas. (Foto: Reprodução)

O mesmo princípio de transferência de mRNA empregado com sucesso em vacinas contra a covid-19 promete combater rugas e tratar doenças como a osteoartrite. Cientistas americanos desenvolveram adesivos de mRNA que imitam mecanismos naturais do corpo humano e eliminaram rugas causadas pela exposição à radiação UV.

Embora só tenha sido testado em animais, o método foi considerado promissor e abre caminho para novas aplicações médicas.

O mRNA nos adesivos contém as instruções genéticas para a pele produzir colágeno. O mRNA, em linhas muito gerais, carrega a receita de um gene para fazer uma proteína – o m é de mensageiro. A célula lê e decodifica a mensagem do gene – no caso, o COL1A1, do colágeno – e passa a produzir a proteína desejada.

A degradação das fibras de colágeno da pele é uma das principais causas da formação de rugas. As rugas se formam em decorrência do processo natural de envelhecimento e dos danos às fibras causados pela exposição à radiação UV do Sol.

O colágeno é a proteína mais abundante da pele. Ele forma fibras, mas com o passar do tempo, elas se tornam desestruturadas e perdem elasticidade, deixando a pele enrugada.

Um arsenal de cremes, injeções e suplementos procura repor o colágeno e, com isso, eliminar as rugas. Porém, os resultados ainda estão aquém dos resultados almejados.

Os cremes ajudam na renovação celular, mas não diretamente na produção de colágeno. E a ingestão de suplementos de colágeno não necessariamente tem efeitos sobre as rugas porque não é possível direcionar para onde vai a proteína ingerida.

A professora Ana Percebom, do Departamento de Química do CTC/PUC-Rio, explica que, quando ingerido, o colágeno é quebrado e seus aminoácidos podem ser direcionados pelo organismo para onde haja maior necessidade, músculos, por exemplo. Não há garantia de que ele irá para a pele.

Por isso, a reposição direta de colágeno pela própria pele sempre foi buscada.

No estudo publicado na revista Nature Biomedical Engineering, Betty Kim e sua equipe do MD Anderson Cancer Medical Center, no Texas, relatam como reduziram em 50% as rugas de camundongos expostos à radiação UV com adesivos com micro-injeções de mRNA.

Kim e seus colegas aplicaram mRNA em camundongos sem pelos expostos à radiação UV. Após 60 dias de exposição, os roedores ficaram com a pele enrugada. Os pesquisadores então trataram quatro animais com os adesivos contendo mRNA, outros quatro com o tratamento tópico convencional para rugas à base de retinoides.

Após 28 dias, os camundongos dois grupos foram comparados com animais que não haviam sido expostos à radiação UV. Os camundongos que receberam mRNA tinham a pele semelhante à dos roedores que não foram expostos à radiação e metade das rugas daquelas observadas no grupo tratado com retinoides.

O pulo do gato da equipe do MD Anderson Cancer Medical Center, no Texas, foi inovar na forma de como levar o mRNA até a pele.

Usar diretamente o mRNA envolto em nanopartículas de lipídios (gorduras) poderia ter efeitos tóxicos e limitações. O novo método permitiu o primeiro tratamento dermatológico a empregar adesivos com microscópicas agulhas capazes de injetar microbolhas chamadas vesículas extracelulares. Dentro dessas vesículas foi colocado o mRNA.

Não houve inchaços, vermelhidões ou quaisquer sinais de inflamação e alergia. E, em média, os efeitos de cada aplicação com adesivos duraram cerca de 100 dias.

As vesículas extracelulares criadas por Kim e seu grupo imitam as que existem no próprio corpo humano. Nossas células produzem pequenas estruturas para transportar pelo corpo moléculas, como os ácidos nucleicos (DNA e RNA). Essas microscópicas estruturas têm o comprido nome de vesículas extracelulares.

Os pesquisadores modificaram as vesículas para transportar mRNA com as instruções necessárias para a produção de colágeno. A vantagem é que por serem biocompatíveis, isto é, compatíveis com o organismo, elas não despertam a fúria do sistema imunológico e, com isso, não causam inflamação e reações alérgicas. Dessa forma, explicou Kim, podem permitir múltiplas aplicações.

Em seu artigo, os cientistas destacaram que as possibilidades desse tipo de tecnologia em medicina são “ilimitadas”. Ela pode ser empregada não apenas com fins estéticos, mas também para tratar tumores e doenças genéticas. “É uma forma inteiramente nova de administrar terapias”, destacou Kim.

No caso específico do colágeno, um exemplo é a osteoartrite, resultado da destruição das cartilagens, onde essa proteína também é abundante.

Mas há possibilidade de terapias ainda mais ambiciosas, como repor proteínas degradadas nos órgãos à medida que envelhecemos.

Outra aplicação em potencial seria combater os males de Alzheimer e de Parkinson e o câncer no cérebro, já que, segundo Kim, as vesículas podem penetrar na barreira hematoencefálica.

Essa barreira protege o sistema nervoso central de ataques de micro-organismos e substâncias tóxicas presentes no sangue, mas também age como um obstáculo intransponível para a maioria dos medicamentos.

Percebom, todavia, adverte que a pesquisa americana é preliminar. São necessários mais estudos com animais e ainda passar por testes clínicos com seres humanos. As informações são do jornal O Globo.

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