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Teto de gastos e arcabouço fiscal

No Brasil, os governantes não costumam ligar causa e efeito, e quando o fazem, embaralham e confundem.

A discussão sobre os juros, por exemplo. Na cabeça de Lula os juros altos são a causa maior das nossas intermináveis dificuldades, dessa sensação incômoda que a cada década perdida se seguirá outra desperdiçada. Nada o convence de que os juros altos são a consequência inevitável do valor e do volume da dívida pública.

É como se fosse possível expandir a dívida pública sem que isso afete o custo de tomar dinheiro emprestado para pagá-la. Acho que Lula, e todos aqueles que assim “pensam”, sabem muito bem de que tanto maior é a dívida, que tanto mais duvidosa a capacidade do devedor de honrá-la, maior será o custo dos juros, Eles sabem, porque isso é primário em economia – é impossível escapar dessa equação.

Mesmo assim, eles que tanto combateram o negacionismo anterior, entretanto agora incorrem em outro, no campo da economia. Trata-se de teimosia retórica, da velha narrativa, velho esforço para escapar à própria responsabilidade.

Em essência os juros altos devem ser levados à culpa do governo, que gasta demais, não do Banco Central, dos banqueiros desalmados, ou da pessoa de Roberto Campos Neto.

No caso de Lula e do PT, há também um conflito de semântica – a nada se dá crédito ao adversário político, e se for mesmo necessário dar continuidade a uma tal política, então ao menos deve-se mudar o nome. Acho uma graça quando Lula diz que , no seu governo, não se falará mais em “gasto” mas em “investimento”, como se com a mudança pudesse melhorar o caixa e a situação das finanças públicas.

Em outra faixa, no que era o teto de gastos, execrado porque tinha origem no “golpista” Temer, o governo atual fez uma ginástica trabalhosa para denominá-lo pomposamente de “arcabouço fiscal”. O arcabouço fiscal de Lula, de Haddad, do governo, não é senão uma tentativa de ludibriar os incautos, uma forma de teto, cheia de mimimis e melindres.

É verdade que, no caso específico, é menos um “teto de gastos” do que uma aposta no aumento de receitas, o qual pode ou não acontecer. Dito de outro modo: há boas possibilidades de que o “arcabouço fiscal” venha a se constituir em um rotundo fracasso, de consequências políticas desastrosas para o grupo que está no poder.

Há algo parecido na nova política automobilística do governo, a promessa de um carro popular, cujo valor fique em torno de R$ 60 mil reais. Claro que é possível um veículo mais barato: basta dar uma canetada reduzindo impostos, desonerando, concedendo incentivos, créditos subsidiados. Mas quem ao final paga, senão o respeitável público? Por que apenas para as multinacionais fabricantes? Por que não outros e demais setores?

Talvez a resposta esteja na velha e conhecida abordagem da indústria automobilística em todos estes anos no Brasil, desde Juscelino: o lobby eficiente. Ou seria porque Lula tem um fetiche pelos fabricantes de automóveis? Com Lula no poder, a indústria automobilística nacional viveu sua era de ouro – nunca fabricaram nem venderam tantos veículos. Nem nunca lucraram tanto.

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