Quinta-feira, 16 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 14 de setembro de 2018
Mesmo durante a recessão, entre 2014 e 2017, mais 2,2 milhões de pessoas que têm ensino superior completo ingressaram no mercado de trabalho. No entanto, a maior parte delas, 1,3 milhão, só conseguiu uma vaga em funções que, no máximo, exigiam conhecimento técnico ou de nível médio. A renda média desse grupo também foi a que mais encolheu no período: quase 10%.
Para especialistas, os números, que fazem parte de um levantamento do Dieese, mostram dois aspectos cruéis da crise. Primeiro, profissionais sem alternativa de emprego acabam empreendendo ou aceitando trabalhos que não exigem maior especialização. Segundo, na outra ponta, a parcela mais vulnerável, de trabalhadores com menor qualificação, é expulsa do mercado.
“É assustador ver um País que investiu na formação de profissionais mais qualificados desperdiçar essa mão de obra e a chance de aumentar a produtividade. Deveríamos estar colhendo esses frutos, mas o que vemos é uma desestruturação intensa e rápida do mercado de trabalho”, diz Patrícia Pelatieri, coordenadora de pesquisa do Dieese.
Paulo Sardinha, presidente da ABRH-RJ (Associação Brasileira de Recursos Humanos no Rio de Janeiro), reconhece que, em períodos de crise, há empresários que aproveitam a grande oferta de mão de obra qualificada para contratar esses profissionais em funções e salários inferiores. Mas considera a política “nada inteligente”, já que, dificilmente, o profissional se acomodará nesse emprego.
“O desemprego prolongado que vivemos faz, em primeiro lugar, a pessoa aceitar trabalhar longe de casa. Se não tiver sucesso, passa a aceitar qualquer vaga, por um salário muito inferior ao que recebia. Do outro lado, quem não teve condições ou oportunidades de evoluir na escolarização permanece desempregado”, observa Sardinha.
Vendedores e motoristas
Segundo a pesquisa, entre os vendedores de porta em porta, o número de pessoas com ensino superior saltou 187% entre 2014 e 2017, de 49,2 mil para 141,2 mil pessoas. O de motoristas de táxis e aplicativos graduados cresceu 125%, para mais de 105 mil, assim como o de trabalhadores de limpeza, que teve alta de 117%, passando para 65,4 mil pessoas com graduação nessa função.
“Aumenta a escolaridade, mas não a produtividade”, diz economista
De 2012 a 2018, cresceu em quase um ano o tempo médio de escolaridade dos trabalhadores brasileiros, de 8,8 anos para 9,7. Os setores que deram os maiores saltos foram a agropecuária, de 4,5 para 5,6 anos; a construção, de 6,6 para 7,5; e o transporte, de 8,5 para 9,4. Os dados são de um levantamento feito pelo economista e pesquisador do Ibre/FGV e IDados Bruno Ottoni. Para o especialista, as dificuldades de se criarem postos de trabalho condizentes com uma melhora na formação educacional não têm a ver apenas com a recessão, mas refletem um problema estrutural da economia brasileira.
Segundo Ottoni, isso tem a ver com um ambiente de negócios que, historicamente, não favorece o desenvolvimento das empresas, porque não as incentiva a se tornarem competitivas. Tem a questão tributária, a falta de infraestrutura. Tudo isso impede que empresas cresçam, se desenvolvam, se tornem competitivas internacionalmente. “É nessas empresas que estão os melhores empregos, que pagam mais. Continuamos com uma maioria de empresas médias e pequenas, informais, que nunca sairão dessa condição”, finaliza.