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Por Redação O Sul | 23 de junho de 2020
O número de transplantes de órgãos no Brasil caiu em mais de 40% desde o início da pandemia da Covid-19, e o de doadores recuou em 34%, de acordo com a Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO). Segundo Gustavo Ferreira, vice presidente da instituição, a queda se acentuou a partir da segunda quinzena de maio, quando houve um recuo de 49%. Nas duas primeiras semanas de junho, a redução já estava em 45%.
A diminuição de transplantes começou a acontecer desde o primeiro óbito pela Covid-19 identificado no País, em 17 de março. Até o último dia 14, segundo a Coordenação Geral Sistema Nacional de Transplantes (CGSNT), a queda no número de transplantes de rim, fígado, pâncreas, coração e pulmões foi de 43%, em média.
De acordo com Gustavo Ferreira, a alta ocupação dos leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI), a redução dos voos — dificultando o transporte dos órgãos pelo País — e o medo de que doadores e pacientes, estes já debilitados, sejam contaminados pelo coronavírus nos hospitais são alguns dos motivos que explicam a realidade atual. Ferreira afirma que a situação é preocupante, já que muitos dependem do órgão para sobrevivência, e não há perspectivas em curto prazo de uma normalização deste cenário:
“O Brasil enfrenta momentos da pandemia muito diferentes regionalmente. É muito difícil prever quando teremos um cenário melhor. Só podemos pensar em voltar ao número pré-crise quando soubermos melhor o futuro da pandemia.”
Segundo Gabriel Teixeira, diretor-geral do Programa Estadual de Transplante (PET) do Estado do RJ, o receio também parte dos médicos:
“Tivemos centros de transplante aqui do Rio que no começo da pandemia, quando tínhamos poucas informações sobre a Covid-19, contraindicaram a cirurgia para todos os seus pacientes.”
Ele afirma que o estado teve o seu melhor 1º trimestre de todos os tempos, e que se não fosse a pandemia, o Rio viveria seu melhor ano para transplantes.
“Apesar de o número ter caído, não interrompemos os nossos serviços por nenhum momento. Alguns pacientes que podem esperar pelo transplante optaram por não realizarem as cirurgias. O receio também parte dos médicos”, disse Teixeira, que informo que, desde março, o Estado do Rio testa possíveis doadores de órgãos para a Covid-19.
Ainda de acordo com o especialista, um dos motivos que pode ter contribuído para a redução de número de transplantes é a menor notificação de potenciais doadores, assim como a possível redução de mortes encefálicas — o que possibilita a doação de órgãos —, provocadas por acidentes, violência e doença cerebrovascular, como o AVC.
“Nossa taxa de aceitação da família para a doação permanece em 75%, então o que realmente caíram foram as notificações de possíveis doadores.”
Sobrecarga
O Brasil realiza cerca de 30 mil procedimentos anualmente e é o maior sistema de transplante público do mundo. Até março, 26.816 pessoas aguardavam órgãos no País, de acordo com a ABTO.
Dessas, 24.879 são demandas por rim. Em maio de 2020, foram feitos 294 transplantes renais. Ano passado, foram cerca de 500 no mesmo mês, quase 30% a mais:
“São pessoas que vão ter que continuar fazendo hemodiálise, o que sobrecarrega ainda mais o sistema, já que, recebendo o órgão, elas liberariam vagas de diálise pra outras pessoas. O Brasil também vive, há anos, no limite de ambulatórios para hemodiálise, com pessoas aguardando às vezes meses para conseguir uma vaga.”