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Política Tribunal de Contas da União livra Lula de devolver relógio e abre brecha para ajudar Bolsonaro

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Decisão é resultado de voto conjunto da ala bolsonarista do tribunal, alinhado aos interesses do ex-presidente da República. (Foto: Agência Senado)

Capitaneado pela ala bolsonarista da Corte, o Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu nessa quarta-feira (7) livrar o presidente Luiz Inácio Lula de devolver um relógio presenteado pela grife francesa Cartier em 2005, no seu primeiro governo, e avaliado em R$ 60 mil na época.

Na prática, o resultado do julgamento poupa Lula do constrangimento de devolver um presente recebido há 19 anos. Mas, acima de tudo, é uma vitória para a defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro, que pretende usar o entendimento do tribunal para escapar de uma denúncia no inquérito das joias sauditas que tramita no STF.

A maioria dos ministros do TCU entendeu que, até que haja uma legislação específica sobre o assunto, não há como enquadrar como “bens públicos” os presentes recebidos pelos presidentes da República no exercício do mandato – e, portanto, a Corte de Contas não pode exigir a sua incorporação ao patrimônio público.

Ou seja, até o Congresso editar uma lei, o ex-ocupante do Palácio do Planalto pode ficar com os presentes, independentemente do valor.

Bolsonaro foi indiciado em julho pela Polícia Federal por peculato, associação criminosa e lavagem de dinheiro no inquérito das joias sauditas, sob a acusação de se apropriar indevidamente de presentes dados por autoridades estrangeiras durante o período em que ocupou o Palácio do Planalto.

Mesmo não sendo parte do caso do relógio de Lula, o time jurídico do ex-presidente vai usar o resultado do julgamento no TCU como fundamentação jurídica para ajudá-lo no caso das joias sauditas.

Isso porque, na sessão dessa quarta-feira, prevaleceu o entendimento do ministro Jorge Oliveira, ex-ministro da Secretaria-Geral da Presidência de Bolsonaro, que concluiu não haver uma norma específica sobre o conceito de “bem de natureza personalíssima” e “elevado valor de mercado” dos presentes recebidos pelos chefes do Executivo ao longo do mandato.

Para o ministro, até que haja uma lei específica sobre o tema, não há fundamentação jurídica para que sejam enquadrados como bens públicos os presentes recebidos por presidentes da República no exercício do mandato – o que, na prática, inviabilizaria qualquer atuação da Corte de Contas para a devolução de bens incorporados ao patrimônio público.

“Não há crime sem lei anterior que o defina. Estou afirmando categoricamente que até o presente momento não existe uma norma clara que trate de recebimento de presentes por parte de presidentes da República e na ausência da norma, não me cabe legislar”, disse Oliveira.

“Não é o tribunal que pode categorizar um bem como patrimônio público. Receber presente é uma praxe. Desde Dom Pedro se recebe presente”, acrescentou.

O voto de Oliveira soou como música para os ouvidos dos bolsonaristas.

Essa é justamente a tese defendida pela defesa de Bolsonaro no caso das joias sauditas. Não à toa, a análise do caso de Lula foi provocada no TCU por uma representação do deputado federal bolsonarista Sanderson (PL-RS).

Adesão no plenário

O entendimento de Oliveira foi acompanhado pelos ministros Vital do Rêgo Filho e Aroldo Cedraz, além de outros dois ministros que acostumam votar de acordo com as teses encampadas pelo campo bolsonarista.

São eles: Jonathan de Jesus, indicado pelo senador Ciro Nogueira (PP), ex-ministro da Casa Civil; e Augusto Nardes, que em 2022 enviou a amigos um áudio no WhatsApp em que comentou um “movimento forte nas casernas” após manifestantes bolsonaristas protestarem na frente de quartéis pedindo intervenção militar contra a vitória de Lula nas eleições. O áudio foi revelado pelo jornal Folha de S. Paulo.

Na petição apresentada na semana passada à Procuradoria-Geral da República (PGR), os advogados de Bolsonaro recorreram ao episódio do relógio de Lula para argumentar que o inquérito das joias, sob o comando de Alexandre de Moraes, deveria seguir os mesmos parâmetros usados para Lula, que recebeu o relógio durante o ano do Brasil na França.

Para a defesa de Bolsonaro, o indiciamento da PF “viola os princípios da isonomia e da obrigatoriedade penal na medida em que situações análogas”, como a de Lula, “receberam tratamento absolutamente distinto” e “foram incorporados aos seus acervos pessoais sem qualquer desdobramento penal”.

Divergência

A ala bolsonarista do TCU impôs uma derrota ao relator do caso, Antonio Anastasia, que também havia defendido o direito de Lula permanecer com o relógio – mas com base em uma tese jurídica que não serviria para blindar Bolsonaro no caso das joias sauditas.

Anastasia destacou que, em 2005, quando Lula recebeu o relógio da marca francesa, ainda não havia a regra estabelecida depois pelo TCU, segundo a qual o presidente da República só pode levar consigo após deixar o cargo peças de uso pessoal e baixo valor – os chamados “itens personalíssimos”.

Esse entendimento foi firmado pelo TCU apenas em 2016, mas aliados de Bolsonaro avaliam que o voto do relator naquele caso, Walton Alencar, deixou uma zona cinzenta ao não delimitar uma linha de corte com um valor para diferenciar os itens personalíssimos dos outros nem estabelecer critérios mais claros para diferenciar uma coisa da outra.

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