Quarta-feira, 25 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 14 de agosto de 2023
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), começou a medir a temperatura em relação à aceitação e eficácia das medidas que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, quer aprovar para aumentar a arrecadação em 2024. Entre elas, está a taxação de fundos de super-ricos e de investimentos feitos por brasileiros no exterior, chamados de offshore.
Lira tem feito consultas a lideranças e representantes do setor privado para avaliar a efetividade dessas medidas, chamadas de “Robin Hood”, por terem como foco a população de mais alta renda.
O temor é de que a mudança na tributação dos fundos leve a uma fuga de investimentos para outros países, como o vizinho Uruguai, e se traduza em pouco ou nenhum efeito arrecadatório, já que os investidores buscariam outros instrumentos para escapar da tributação mais alta.
A movimentação de Lira nos bastidores ocorre em meio ao ceticismo do mercado financeiro em relação ao cumprimento da meta definida por Haddad, de zerar o déficit das contas do governo no ano que vem, e às vésperas do debate sobre o Orçamento de 2024, que será enviado pelo governo até 31 de agosto. O projeto já terá de contar com a previsão de medidas arrecadatórias.
O resultado dessas sondagens já pode ser visto nas falas recentes do parlamentar, que tem apontado que não basta elevar a arrecadação, que também é necessário olhar para o lado da despesa e “equilibrar todos os pratos”. Lira colocou na mesa na semana passada a necessidade de se fazer a reforma administrativa, proposta que o governo Lula até agora não manifestou nenhum interesse em tocar.
Nos bastidores, a avaliação é de que, mesmo que a reforma do RH do Estado não produza resultados fiscais no curto prazo, haverá ganho de credibilidade e, consequentemente, uma melhora nas expectativas, com reflexo no preço dos ativos.
Em reunião com o relator da Lei de Diretrizes Orçamentária (LDO), Danilo Forte (União-CE), Haddad disse que com três iniciativas – a taxação dos fundos exclusivos (usados pelos super-ricos), a dos fundos offshore e a volta do voto de desempate no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) – é possível manter a meta de zerar o déficit no ano que vem. A maior parte dos recursos viria de um acordo com a Petrobras em julgamentos da petroleira no Carf, que é uma espécie de tribunal da Receita Federal.
Forte disse, porém, que não vê espaço para a aprovação de medidas que aumentem a carga tributária. Nem mesmo as propostas “Robin Hood”.
“É muito difícil aumentar imposto nessa altura do campeonato”, afirmou o relator. “E o Arthur já disse que não vota essa matéria (as medidas arrecadatórias) enquanto não concluir a questão da reforma tributária. Para este ano será muito difícil. Não vejo ânimo e boa vontade para votar.”
Na conta matemática da Fazenda, também está sendo computada a vitória que o governo obteve no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu que benefícios estaduais não podem ser abatidos de tributos federais. Logo, as empresas terão de pagar mais impostos.
A equipe econômica vai buscar, ainda, aprovar mudanças nos chamados Juros sobre Capital Próprio, um instrumento que permite às empresas remunerar seus investidores como despesa e, assim, abater do Imposto de Renda. O texto deve ser enviado ao Congresso juntamente com o Orçamento.
Lideranças do Congresso, no entanto, têm sido alertadas por economistas do mercado que as medidas serão insuficientes para zerar o déficit, e que as previsões de arrecadação da equipe de Haddad estão infladas. A desconfiança com o potencial arrecadatório dessas medidas já alimenta a especulação de que a meta será alterada.
Déficit zero
Apesar do ceticismo, a equipe econômica bateu o martelo e tem reforçado que não há mudanças de planos. A interlocutores, Haddad garantiu que o projeto de Orçamento será enviado com a meta fiscal de 0% para o resultado das contas do governo.
Auxiliares do ministro afirmam que a pasta tem planos A, B, C, D e E para garantir a arrecadação necessária para alcançar o objetivo. As medidas teriam de gerar pelo menos R$ 100 bilhões adicionais para zerar o déficit.
Lideranças dos principais partidos da Câmara avaliam que a evolução dos debates fiscais depende de novas conversas entre Haddad e Lira. “Não adianta antecipar a discussão dos fundos (exclusivos), é preciso discutir em cima do texto”, diz o líder do MDB, Isnaldo Bulhões (MDB-AL).
“Difícil tratar desses temas antes de chegarem à Casa. O ambiente estará mais favorável após a conclusão da reforma tributária”, reforçou o líder do União Brasil, Elmar Nascimento (União-BA).
Desafio
O deputado Áureo Ribeiro, que lidera o Solidariedade, avalia que, se houver diálogo entre Haddad e Lira, as medidas arrecadatórias podem avançar, mas pondera que não adianta discutir teoria: “Tem que colocar no papel, a gente vai ver a reação do mercado, da imprensa e depois formar opinião. Ou então o Haddad chama os líderes e detalha o que quer. Ele já aprovou bastante coisa no primeiro semestre, pode esperar pela conclusão da reforma tributária.”
O ministro da Fazenda se comprometeu em enviar, neste mês de agosto, um projeto para taxar os fundos de investimentos exclusivos. O texto, no entanto, ainda não chegou à Câmara. Uma tentativa similar ocorreu no governo Michel Temer, quando o presidente da Câmara era Rodrigo Maia, mas não avançou.
Na ocasião, o governo previa arrecadar pouco menos de R$ 11 bilhões com a iniciativa e a resistência apareceu também entre as instituições financeiras.