Sábado, 23 de novembro de 2024
Por Redação O Sul | 16 de fevereiro de 2019
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul. O Jornal O Sul adota os princípios editorias de pluralismo, apartidarismo, jornalismo crítico e independência.
Lendo uma porção de livros nestes dias, deparei-me novamente com Machado de Assis, com um conto, não muito lembrado, chamado Fanqueiros Literários. Do século XIX para o século XXI, os fanqueiros literários se multiplica(ra)m.
Machado sabia das coisas. No seu tempo. E sabia que isso só pioraria. “Querendo imitar os espíritos sérios, lembra-se o fanqueiro de colecionar os seus disparates, e ei-lo que vai de carrinho e almanaques na mão — em busca de notabilidades sociais. (…) O livrinho é prontificado e sai a lume. A teoria do embarcamento dos tolos é então posta em execução; os nomes das vítimas subscritoras vêm sempre em ar de escárnio no pelourinho de uma lista-epílogo”.
E completa, sarcasticamente, o nosso Flaubert: “Mas tudo isso é causado pela falta sensível de uma inquisição literária! Que espetáculo não seria ver evaporar-se em uma fogueira inquisitorial tanto ópio encadernado que por aí anda enchendo as livrarias! ” Bingo.
Claro que não quero index ou fogueiras. Nem Machado queria. Falava em sentido figurado. Como eu. Por que estou escrevendo isso? Para dizer que por aqui se aplicaria bem a tese machadiana do fanquerismo. Cultura de WhatsApp e “literatura” pret-à-porter. Tempos de coaching de todos os tipos. Autoajuda. Especialistas em “não saber”. Opina-se sobre tudo. Cada um se sente o editor do mundo.
Nestes tempos de crise, cresce o opinionismo. Sobe a temperatura do individualismo. Divirto-me escutando rádio, locus privilegiado do opinionismo. Na TV também tem muito. E como tem.
Cada um por si. Você é um self made man. Você consegue. Não importa a estrutura. Importa é você. Você pode ser um herói(na). Como Zorro ou Batman. Qual é o problema do herói ou super-herói? Nas histórias do Oeste americano, o cavaleiro solitário chega e coloca ordem nas coisas. Para que a lei (claro, o status quo) volte a prevalecer, o herói não precisa… de lei. Só da lei… dele mesmo. Batman é um bom (ou mau) exemplo disso. Ele acusa, julga e condena. Sem direito à defesa.
A fantasia-do-self-made-man-of-justice é o nirvana de quem acha que o país necessita de heróis. Necessitar de heróis quer dizer que podemos colocar na fantasia a nossa incapacidade de superar a burocracia e a ignorância. Em vez de pesquisar, estudar a fundo, pegamos um atalho. Vamos pelo caminho do resumo. Atalho é sempre um caminho facilitado para chegar antes dos outros. Você pode pegar esse atalho, eis a mensagem. Lembremos que os heróis ou super-heróis tem dupla identidade.
Normalmente a sua vida é medíocre, como a de Clark Kent, que é um repórter de meia tigela. Entretanto, na sua vida dupla, transforma-se.
No século XIX Machado era um crítico feroz da mediocridade. Do mediano. Do alpinismo social. Há um conto para cada “ocasião”. Machado de Assis era um visionário. O que Machado diria das redes sociais? Por certo escreveria belos contos sobre coachings tipo planeje-e-passe, com certificação em inglês: Certified Professsional Coach. De fato, o Brasil não é para principiantes. Não é para amadores.
Pindorama exige uma doutrina coaching. Tudo o que está aí é fruto de muitíssimo esforço.
Como dizia o velho Barão de Itararé (o nosso Aparicio Torelli), “de onde menos se espera, dali mesmo é que não sai nada”! Bingo!
Ah: ele também disse que tudo seria fácil… se não fossem as dificuldades.
Esta coluna reflete a opinião de quem a assina e não do Jornal O Sul.
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