Além da inflação, um outro componente passou a influenciar as decisões dos bancos centrais sobre o rumo dos juros: o risco de uma crise bancária. A quebra de bancos médios dos Estados Unidos e o resgate do Credit Suisse levaram a uma mudança de rota na política de juros.
A ata do mais recente encontro do Fed (Federal Reserve), por exemplo, mostrou que integrantes do banco central dos EUA cogitaram um aumento nos juros de 0,50 ponto porcentual, mas desistiram e optaram por um ajuste de 0,25 ponto por causa da crise bancária.
“A quebra dos bancos vai acarretar retração do crédito bancário, que, por sua vez, vai prejudicar as condições financeiras. Isso afeta a atividade econômica, que, mais adiante, vai derrubar a demanda – o que derruba a inflação”, explica José Júlio Senna, ex-diretor do Banco Central (BC) e chefe do Centro de Estudos Monetários do Instituto Brasileiro de Economia, da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV). “Mas o Fed ainda não sabe a intensidade desse movimento.”
Na próxima reunião, os economistas avaliam que o Fed deve promover uma nova alta de 0,25 ponto porcentual, levando os juros para a faixa de 5% a 5,25% ao ano e encerrando o ciclo de aperto monetário. “A gente chegou a vislumbrar os juros acima de 5,5%, mas migramos de cenário com a questão dos bancos pequenos”, diz Andréa Damico, sócia e economista-chefe da Armor Capital.
Inflação persistente
Ao longo dos últimos anos, a economia global enfrentou um cenário perverso de inflação. A pandemia provocou uma desorganização na cadeia de produção de vários setores e levou a uma escassez de produtos, o que pressionou custos globais.
A retomada da economia, depois de superada a fase mais aguda da crise sanitária, provocou uma alta de preços de commodities, o que tornou ainda mais complicado domar a inflação. Se o cenário era difícil, a guerra entre Ucrânia e Rússia provocou uma nova escalada de preços.
“Os bancos centrais relutaram muito, no começo, em aceitar que a alta de preços seria um fenômeno persistente. Essa dificuldade de perceber a natureza do processo inflacionário acabou dando asas para a própria inflação, que adquiriu raízes mais profundas”, diz Senna.
“Uma parte do processo já está sendo corrigida. A inflação de bens desceu muito fortemente, com o recuo da pandemia e a normalização das cadeias de suprimento. Só que agora restam desequilíbrios importantes e a política monetária tem de combater o que se chama de inflação nuclear, como a inflação de serviços, que ainda está muito carregada.”
Grupos
É possível dividir o movimento de aperto global de juros em três grandes grupos. O primeiro foi liderado em grande parte pelos países emergentes, incluindo o Brasil – a Selic está em 13,75% ao ano. Foram essas economias que subiram os juros, já atingiram o pico da inflação e podem ser os primeiros a iniciar o ciclo de cortes.
“Uma vez que o País pausa (o aperto), o BC leva ao redor de um ano para cortar os juros”, diz Kaian Oliveira, economista internacional da Parcitas Investimentos. “As curvas globais já refletem um pouco essa ideia de corte para vários países.”
O segundo bloco foi formado pelos países desenvolvidos, que demoraram mais para começar o aperto e ainda têm uma inflação resiliente, como é o caso de Estados Unidos e da Europa, embora o Banco Central Europeu (BCE) esteja um passo atrás do Fed. E, por fim, há o conjunto dos países asiáticos, que não sofreram tanto com a inflação.