Domingo, 22 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 16 de setembro de 2024
Estudos recentes também já têm ligado o uso de redes sociais ao vício e a problemas de saúde mental em crianças e adolescentes.
Foto: Isac Nóbrega/PRUtilizando o cartão dos pais, um jovem de 16 anos perdeu R$ 4 mil apostando em jogos no seu celular. A família demorou a perceber o vício nas chamadas bets porque, como quase sempre acontece, os palpites começam com valores menores.
Outro jovem, de 15 anos, de uma escola de elite de São Paulo e apaixonado por futebol, achou divertido apostar a mesada junto com amigos e ver quem acertava mais o número de passes em um jogo. Numa escola pública, um aluno pediu Pix de R$ 3 para a professora para jogar nas bets.
A falta de regulamentação no País, que só agora começa a ser enfrentada, também permite que o público infanto-juvenil fique desprotegido e tenha acesso a uma atividade proibida para menores. O Instituto Jogo Legal, entidade que representa o setor, diz que o problema está nos sites irregulares.
O fato de os jogos estarem disponíveis em celulares, além de facilitar o acesso, incorpora uma camada de preocupação. Estudos recentes também já têm ligado o uso frequente de aparelhos e redes sociais ao vício e a problemas de saúde mental em crianças e adolescentes. Tem aumentado também o número de escolas que proíbem o uso.
Recentemente, o Instituto Alana denunciou a empresa Meta, dona do Instagram, ao Ministério Público de São Paulo após identificar dez perfis de influenciadores mirins que promovem sites de apostas para menores. Eles têm entre 6 e 17 anos e são de Alagoas, do Ceará, da Paraíba, do Rio e de São Paulo. Além de recrutar crianças para publicidade, essa teia ilegal de interações já adentrou o ambiente escolar e tem levado ao vício em jogos de azar.
Em grande parte, os chamados publiposts são gravados pelos pais ou responsáveis legais dos menores e associados a sorteios de motos, celulares e dinheiro. Os canais têm entre 200 mil e mais de 9,5 milhões de seguidores, muitos deles também crianças. Os conteúdos de cassino online divulgados nos perfis dos influenciadores mirins costumam ficar disponíveis por 24 horas com um link que diz que a plataforma indicada está pagando para quem desejar apostar.
“É possível ver nas respostas aos posts que inúmeras crianças comentam e são influenciadas. A falta de regularização desses jogos e de fiscalização da Meta contribuem para violação dos direitos. As famílias são a ponta mais fraca, porque todos estão imersos na febre dessas publicidades ilegais”, alerta Maria Mello, coordenadora do Criança e Consumo do Instituto Alana.
Ao reportar as publicidades como fraudulentas no Instagram, o instituto diz ter recebido respostas, em alguns casos, de que os conteúdos não violavam as regras da rede social. A Meta rebateu a informação, em nota, alegando que não permite menores de 13 anos em suas plataformas, salvo em casos de contas gerenciadas por um responsável, e que remove “conteúdos potencialmente voltados a menores de 18 anos que tentem promover jogos online envolvendo valores monetários”. A Promotoria da Infância e Juventude de São Paulo analisa a denúncia do Alana.
“A ideia da aposta é mágica. É visto como um mecanismo de recompensa rápida e fácil que atrai as crianças”, diz Isabel Kahn, professora da faculdade de psicologia da PUC São Paulo.
Os jogos de azar são ilegais e proibidos no Brasil. Já as Bets, casas de apostas esportivas na internet, foram regulamentadas no ano passado. Apesar disso, em ambos os casos, expor menores a atividades ilícitas ou nocivas ao seu desenvolvimento pode ser considerado crime, segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, e fere ainda leis de proteção à infância e regras de entidades como o Conselho Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e o Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar).
De acordo com o psiquiatra Daniel Spritzer, coordenador do grupo de estudos sobre vícios tecnológicos, a publicidade apresenta um impacto direto por apresentar o jogo de azar como uma atividade socialmente desejável e divertida. Isso pode influenciar jovens a verem essas práticas como inofensivas. Além disso, diz o médico, as plataformas promovem uma visão distorcida sobre dinheiro e sucesso.