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Um ministro do Supremo disse que há gabinetes do STF “distribuindo senha para soltar corrupto”

O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo. (Foto: Nelson Jr./SCO/STF)

O ministro Luís Roberto Barroso, do STF (Supremo Tribunal Federal), diz que, no momento em que são celebrados os 30 anos da Constituição brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, é necessário “renovarmos nossos compromissos democráticos”. Ele diz ainda que há no STF gabinetes “distribuindo senha para soltar corrupto”. A informação é do jornal Folha de S. Paulo.

Barroso disse ainda que a corrupção no Brasil foi endêmica e que há uma aliança entre “corruptos, elitistas e progressistas” para que o combate a ela seja interrompido.

1. Quando a Constituição brasileira completou dez anos, o senhor celebrou as liberdades partidária, de imprensa, eleições livres e uma sociedade politicamente reconciliada. Quando ela fez 20 anos, ressaltou um Estado democrático estável. É possível repetir essas afirmações hoje?

Eu tenho um olhar positivo e construtivo de uma maneira geral. Portanto eu acho que, nesses 30 anos da Constituição, há conquistas relevantes a serem celebradas: a estabilidade institucional e monetária e uma expressiva inclusão social.

Além disso, nós tivemos avanços muito importantes em direitos fundamentais, das mulheres — na conquista da liberdade sexual, igualdade na sociedade conjugal, avanço no mercado de trabalho e na luta contra a violência doméstica.

Houve também vitórias em favor dos afrodescendentes, da comunidade LGBT, na dramática situação dos transgêneros, que passaram a poder fazer a cirurgia de redesignação de sexo no SUS e a adotar seu nome social no registro civil.

Tivemos avanços na liberdade de expressão, com o fim da lei de imprensa e da exigência de autorização para se escreverem biografias.

Ao olhar o filme da democracia brasileira, é preciso reconhecer que ele é bom. Agora, há os pontos baixos.

2. Quais seriam?

A corrupção que se verificou no Brasil não foi produto de falhas e fraquezas humanas.

Foi uma corrupção estrutural, sistêmica e programada de arrecadação e de distribuição de recursos públicos com um nível de contágio muito impressionante.

A sociedade, felizmente, num determinado momento, começou a reagir. E deixou de aceitar o inaceitável.

A coisa mais importante que há no Brasil hoje é essa imensa demanda da sociedade por integridade, idealismo e patriotismo. É essa a energia que empurra a história e muda paradigmas.

A corrupção foi produto de um pacto oligárquico celebrado entre parte da classe política, parte da classe empresarial e parte da burocracia estatal. Precisamos substituí-lo por um pacto de integridade.

Não tem sido um processo histórico fácil, em razão de três obstáculos: parte do pensamento progressista acha que os fins justificam os meios e que a corrupção é apenas uma nota de pé de página na história. Eu penso que eles estão errados.

Segundo obstáculo: boa parte das elites brasileiras acham que corrupção ruim é a dos adversários. Se for a dos companheiros de pôquer, de mesa e de salões, não tem muito problema.

O terceiro obstáculo são os próprios corruptos — os que não querem ser punidos, o que é um sentimento humano compreensível, e os que não querem ficar honestos nem daqui para a frente.

O nível de contágio da corrupção uniu essas pessoas numa aliança entre corruptos, elitistas e progressistas.

Eu não vou citar nomes porque não posso. Mas eu considero que esta é a última missão da nossa geração.

Nós derrotamos a ditadura, a hiperinflação, obtivemos vitórias expressivas contra a pobreza extrema. A nossa última missão é empurrar a corrupção para a margem da história. E depois nós podemos sair do caminho.

O Brasil é o 96º colocado no índice de percepção de corrupção da Transparência Internacional. Eu acordo todos os dias envergonhado com esse número.

A despeito disso, menos de 1% dos presos do sistema está lá por corrupção ou por crime de colarinho branco. Tem alguma coisa errada nisso.

E ainda assim, no Supremo, você tem gabinete distribuindo senha para soltar corrupto. Sem qualquer forma de direito e numa espécie de ação entre amigos.

3. Que gabinetes, ministro? O senhor não acha um risco o senhor falar de forma genérica?

Tem gabinetes. [seguindo] Quando a Justiça desvia dos amigos do poder, ela legitima o discurso de que as punições são uma perseguição.

Nota

Nesta quarta-feira (26) o ministro do STF Luís Roberto Barroso divulgou nota afirmando que o “tom excessivamente ácido” que empregou na entrevista concedida ao jornal “não corresponde” à sua “visão geral do Tribunal.

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