Uma vacina por spray nasal contra o novo coronavírus está sendo desenvolvida por cientistas da Universidade de São Paulo (USP). Um protótipo de imunização já foi aplicado para combater a hepatite B em camundongos, que devem ser testados nos próximos três meses com um novo modelo redirecionado para coibir a SarS-Cov-2.
Caso seja aprovado, a estimativa é que o produto seja comercializado por aproximadamente R$ 100 e com capacidade para produção inicial de 24 mil doses por semana até o final deste ano ou início do próximo.
A nanopartícula foi desenvolvida a partir de uma substância natural, dentro da qual foi colocada uma proteína do vírus da Covid-19. Com propriedade muco-adesiva, ela permite que o material permaneça nas narinas de três a quatro horas até ser absorvido pelo organismo e não seja expelido por espirros. Uma vez administrada, ela ativa a resposta imune pela produção da imunoglobulina A secretora (sIgA) – anticorpos presentes na saliva, na lágrima, no colostro e em superfícies do trato respiratório, intestino e útero.
A pesquisa é coordenada pelo médico veterinário Marco Antonio Stephano, da Faculdade de Ciências Farmacêuticas (FCF), que desenvolve modelos vacinais na USP desde 2009. “Essa ideia surgiu em 2009, quando fiz duas dissertações de mestrado sobre hepatite B. Aquela ideia acabou ficando na gaveta, mas depois se transformou em um estudo para uma vacina contra a zika. Agora, veio a Covid-19 e pensei, bem, qual é o anticorpo presente no pulmão das pessoas?”, conta Stephano.
O professor então encontrou um trabalho de 1978 sobre concentrações de anticorpos no pulmão. A partir dele, Stephano descobriu que pessoas sem histórico de doenças ou infecções têm um índice baixo de anticorpos no pulmão, que só aumentam quando há inflamação.
“É preciso parar o vírus da Covid-19 antes de ele chegar ao pulmão. Se eu tiver anticorpos na mucosa, fazendo imunização no local, seria a forma ideal de conseguir isso. Não que as outras vacinas também não consigam isso, mas demorariam mais”, explica.
Vantagens
A imunização nasal traz vantagens em relação às vacinas injetáveis, afirma Stephano. Além de crianças e adultos terem rejeição de 85 e 30%, respectivamente, a injeções, o spray não seria tão invasivo e geraria menos reações ou efeitos colaterais.
Para garantir a imunização total, o paciente precisará de quatro doses: uma em cada narina, repetidas 15 dias depois da primeira aplicação. “É como se fosse um rinosoro [descongestionante nasal]. Já existe uma vacina assim usada para a gripe, nos Estados Unidos e Europa, mas não chegou ao Brasil”, explica Stephano.
O projeto ainda está sendo desenvolvido em parceria com virologistas e imunologistas do Instituto de Ciências Biomédicas, especialistas em nanotecnologia do Instituto de Química da USP, pesquisadores da Plataforma Científica Pasteur-USP, da Unicamp, e uma startup. O objetivo é que, quando estiver pronta, a produção seja totalmente nacional e o valor de R$ 100 repassado para o consumidor cobriria apenas esse custo de fabricação.
“O dinheiro que a Fapesp e a CNPq liberaram não dá nem para o cheiro. Empresas do setor privado que estão nos buscando para dar apoio”, complementa o professor.