Sexta-feira, 17 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 17 de janeiro de 2025
A possível união entre a Gol e a Azul é vista como um “mal necessário” por analistas do setor aéreo diante da situação financeira das empresas, cujas dívidas aumentaram durante a pandemia. Na visão deles, sem o acordo, há risco de uma das companhias acabar encolhendo demais ou até quebrando.
“O ideal seria as três (Azul, Gol e Latam) operando de forma independente e saudável”, diz o consultor André Castellini, sócio da Bain & Company e especialista no setor aéreo. “Mas isso não parece ser possível. A Azul estava com dificuldade para cumprir as obrigações, vinha reduzindo a malha. E a Gol estava protegida por causa do Chapter 11 (recuperação judicial pedida nos Estados Unidos).”
Antes cético em relação à probabilidade de o negócio se concretizar, o analista de transportes Alberto Valerio, do UBS BB, diz começar a ver o acordo com “mais bons olhos”. Para ele, seis meses atrás, uma possível união entre as duas empresas seria mais benéfica para a Azul do que para a Gol. Isso porque a Azul ainda não havia reestruturado suas dívidas, enquanto a Gol já estava em conversa com credores dentro do processo de Chapter 11. Em dezembro, porém, a Azul anunciou ter fechado acordos com credores que a colocam numa situação mais semelhante à da Gol.
“A Azul tinha muito trabalho para fazer. Agora, acho que tem mais interesse das duas partes em um acordo”, diz o analista. “O negócio também pode ajudar a Gol, que tem que levantar US$ 1,87 bilhão para sair do Chapter 11 em um mercado desafiador.”
Questionado sobre a possibilidade de o consumidor ter de arcar com um aumento de tarifas, dada uma maior concentração do mercado, Castellini pondera que a situação hoje é diferente do que se tinha antes da pandemia e que o cenário também não seria favorável ao passageiro se a Azul tivesse que deixar de operar outros destinos.
“A consequência para o consumidor depende das alternativas que existem hoje. Mas, com a fusão, com certeza não vai haver redução de tarifa. As empresas têm hoje custos de dívida exorbitantes e quem está disposto a emprestar dinheiro para elas exige um juro muito alto.”
Valerio também afirma acreditar que uma fusão entre as aéreas não é o ideal, mas que, caso ela não ocorra, o resultado pode ser pior. “Seria muito ruim ter uma delas muito pequena ou fechando.”
Pacote de riscos
O analista do UBS BB frisa, porém, que as duas companhias podem sobreviver sozinhas e até crescer se a economia brasileira continuar avançando, mas os riscos são altos demais. “A aviação é um pacote de riscos. Tem o risco do petróleo, o da demanda, o do juro, o do dólar. É um setor muito difícil. Nunca se sabe.”
Castellini destaca que a desvalorização do real no último ano deixa as empresas aéreas em situação ainda mais delicada. Com 60 % dos custos em dólares, as companhias foram impactadas negativamente pela cotação da moeda, que passou de R$ 4,84 no começo de 2024 para os atuais R$ 6.
O consultor lembra que, com a união dos negócios, a Azul e a Gol poderão reduzir seus custos dado o aumento de escala. “Não deverá ser um ganho enorme, porque as operações devem permanecer separadas, mas sempre dá para unir a parte de aeroporto, administrativa e de sistemas.” Castellini ressalva que os desafios de integração serão significativos, sobretudo devido às culturas diferentes.
Latam
Se o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) aprovasse a união da Gol e da Azul como elas são hoje e sem restrições, a empresa que surgisse do acordo passaria a deter 60,8% do mercado doméstico – enquanto a Latam ficaria com 38,7%. Procurada, a Latam não comentou o assunto.
Apesar de acabar se tornando a menor companhia entre as líderes do mercado brasileiro, a Latam não perderia competitividade de modo significativo diante da nova empresa, segundo os especialistas. Isso porque a Latam já conta com vantagens por fazer parte de um grupo que opera em toda a América Latina e, portanto, tem um certo poder de barganha entre fornecedores. Hoje, a Latam tem uma frota de cerca de 345 aviões. Gol e Azul, juntas, passaria a ter 370 aeronaves. (Estadão Conteúdo)