Sexta-feira, 07 de fevereiro de 2025
Por Redação O Sul | 28 de maio de 2019
Inicialmente voltado para as classes C e D, o cartão pré-pago começa a ampliar seu público. Ele se tornou alternativa tanto para consumidores de classe média preocupados com segurança e controle do orçamento quanto para empresas de telemarketing que depositam o salário de empregados sem conta em banco.
Dados da Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços) mostram que o volume movimentado com esse meio de pagamento aumentou 66,5% e passou de R$ 6,6 bilhões em 2017 para R$ 11 bilhões no ano passado. Para este ano, a previsão é que o montante chegue a R$ 18,55 bilhões.
O volume ainda é tímido se comparado ao do cartão de crédito tradicional, mas o ritmo de expansão é acelerado. Caso a projeção para este ano se confirme, haverá expansão de 68,6%. Para Fábio Bentes, economista da CNC (Confederação Nacional do Comércio), o aumento do uso do pré-pago é uma herança da crise, que deixou o consumidor mais cauteloso na gestão das contas do mês:
“A cicatriz da crise no bolso do brasileiro ainda é muito recente. As famílias se apoiaram muito no crédito, elevando o grau de endividamento. O consumidor aprendeu da pior forma possível e agora está recorrendo ao planejamento financeiro. Essa modalidade, que antes era para viagens ao exterior, está entrando no consumo do varejo, o que é positivo de um modo geral.”
Aumento da inadimplência
O empresário Alessandro Pinto, de 45 anos, viu o cartão à venda pela primeira vez na fila do supermercado e decidiu adquiri-lo para que a empregada fizesse as compras do mês:
“Ajuda no controle de gastos e evita que a gente fique andando com dinheiro em espécie. Depois comprei para mim, para ter mais segurança nas compras online.”
O cartão pré-pago foi regulado pelo Banco Central como modalidade de pagamento em 2014. Ele pode substituir o cartão de crédito na contratação de serviços de streaming e aplicativos de transporte, por exemplo. Na prática, porém, funciona como débito, pois o cliente conta apenas com o saldo depositado ou transferido para o cartão.
Enquanto as instituições financeiras justificam as taxas de juros cobradas no cartão de crédito em razão da inadimplência dos clientes, os pré-pagos atraem um público à caça de tarifas menores. Entre as empresas que oferecem esta modalidade de pagamento há fintechs, como a Acesso e a Agillitas, e bancos tradicionais, como Bradesco, Banco do Brasil, Itaú e Santander.
No momento em que o desemprego atinge 13,4 milhões de pessoas e que o tempo médio para arrumar uma vaga supera um ano, manter a conta aberta em banco pode ser um fardo a mais para quem deixa de contar com salário. Após ficar desempregada, Amanda Santos, de 32 anos, decidiu encerrar sua conta corrente. Ao retornar ao mercado de trabalho, há um ano, optou por receber o salário e o vale-transporte em um pré-pago.
Pesquisa do Banco Central mostra que 58% dos chamados desbancarizados não têm conta em instituição financeira por falta de dinheiro ou em razão do custo alto. Em compensação, o mesmo levantamento mostrou que 60% deste público têm acesso a celular e internet. Existem 50 milhões de pessoas no Brasil sem conta nos bancos tradicionais.
— Moro em São Paulo, e acho ótimo porque consigo fazer a recarga no cartão do ônibus pelo aplicativo do cartão. Na empresa de telemarketing em que trabalho, 400 funcionários recebem o pagamento por meio desse tipo de cartão. Acabamos economizando, porque é preciso ter o dinheiro na conta para conseguir comprar — disse Amanda.
Dados de pesquisa da CNC sobre endividamento, divulgada em abril, mostram que 62,7% das famílias estão endividadas no país. Deste total, quase 80% das dívidas vêm de cartões de crédito.
Bentes, da CNC, pondera que um dos fatores que podem justificar o aumento do uso do pré-pago é a inadimplência maior:
“Quem procura esse tipo de cartão também faz isso por dificuldade de acesso a crédito, já que não consegue obter por não ter emprego formal ou porque a renda oscila muito.”
Para a planejadora financeira Myrian Lund, o pré-pago pode ser parte da estratégia para organizar os gastos.
“Pode ser uma forma de ensinar os filhos a lidar com o dinheiro com mais responsabilidade. Para quem está com nome sujo e tenta se reorganizar, é possível depositar o dinheiro disponível no pré-pago e deixá-lo como reserva, enquanto se organiza para pagar empréstimos”, explicou.