Quinta-feira as cadeias se agitaram. Mais inquilinos chegaram lá. Entre eles, um peixe grande. É Luiz Fernando Pezão, governador do Rio. A notícia pegou repórteres desprevenidos. Não deu outra. Muitos trocaram as bolas. Em vez de mandado de prisão, disseram mandato de prisão. Esqueceram-se de pormenor pra lá de importante — uma letra faz a diferença.
Mandato é o poder de representação. Presidente, senadores, deputados, governadores, prefeitos, vereadores têm mandato. São eleitos por determinado período. O advogado também recebe mandato para defender o réu.
Mandado pertence a outra tribo — a de mandar. Significa ordem. No caso judicial, é ordem dada por juiz ou tribunal. Aí se chama mandado judicial. É o caso do mandado de segurança.
É a lei
Ao ser levado para o xilindró, Pezão apelou para o latim. Baixinho, disse: “Dura lex, sed lex”. Tradução: a lei é dura, mas é lei.
Pedir e pedir
Às seis horas, a polícia chegou ao Palácio Laranjeiras. Exibiu o mandado de prisão. O governador não resistiu, mas fez um pedido. Queria tomar banho e fazer a barba. Conjugou, então, o verbo pedir. Com ele, uma questão de regência. Ele pediu para o deixarem tomar banho e fazer a barba? Ou pediu que o deixassem tomar banho e fazer a barba?
Pedir para é duplinha manhosa que só. Ela esconde o substantivo licença. Pedir que, ao contrário, joga limpo. Sem esconder nada, significa solicitar. Ora, o governador pediu licença. Logo, pediu para o deixarem tomar banho e fazer a barba. Pediu para tomar banho e fazer a barba.
Não é pedido de licença? Então estendam o tapete vermelho para pedir que: O empregado pediu ao chefe que não lhe desse só aumento de trabalho. Mas um aumentinho de salário. A procuradora pediu que os repórteres saíssem da sala.
Boca de lobo
A Polícia Federal é pra lá de criativa ao nomear as operações. A de quinta-feira se chama Boca de lobo. Por quê? Trata-se de alusão ao dinheiro público que vai pelo ralo da corrupção. Ao escrever o trio, pintou a dúvida — com hífen ou sem hífen?
A reforma ortográfica se encarregou de cassar o tracinho que juntava três ou mais palavras para formar outro vocábulo. É o caso de pé de moleque, testa de ferro, mão de obra, tomara que caia e boca de lobo. A turma se escrevia com hífen. Agora se grafa livre e solta. Coisa boa!
Desperdício
Raquel Dodge falou sobre a Operação Boca de Lobo. Em entrevista à imprensa, ela disse que “os infratores ainda continuam a praticar crimes”. Desperdiçou vocábulos. Sem pensar em economia, usou duas palavras em lugar de uma. Ainda indica continuidade. Continua transmite a mesma ideia. Xô, pleonasmo! Melhor ficar com uma ou outra: Os infratores continuam a praticar crimes. Os infratores ainda praticam crimes.
Desacordo
Na mesma entrevista, a procuradora-geral da República disse sem corar: “Como está sendo feito a lavagem…” Ops! Caiu na cilada do sujeito posposto. Falantes se esquecem de fazer a concordância quando o sujeito vem depois do verbo. Para acertar sempre, basta mudar a ordem do termo. Assim: Como a lavagem vem sendo feita…
Leitor pergunta
Li que as palavras persiana, veneziana, damasco, havana, bengala, hambúrguer têm origem em nome de lugares. Verdade? — Ana Maria Silva, BH
Sim, são topônimos. Persiana vem de Pérsia. Veneziana, de Veneza. Havana, de Cuba. Damasco, de Damasco, capital da Síria. Bengala, de Bengala, região da Índia. E hambúrguer?
A almôndega achatada metida a besta era levada pelos emigrantes alemães para os Estados Unidos. No começo, a carninha se chamava hambúrguer steak (bife de Hamburgo). Depois, virou hambúrguer. Mais tarde, a preguiça falou alto. Tornou-se búrguer.