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Veja as razões que ajudam a explicar a derrota da direita no Reino Unido após 14 anos no poder

Keir Starmer é o novo primeiro-ministro britânico. (Foto: Downing Street/Divulgação)

Após 14 anos, o Partido Conservador vai deixar o poder no Reino Unido. Os primeiros resultados oficiais das eleições realizadas na quinta-feira (4) mostram que a oposição trabalhista conquistou uma vitória esmagadora nas eleições nacionais, vencendo ao menos 410 dos 650 assentos do Parlamento.

O partido do agora ex-premiê Rishi Sunak elegeu cerca de 120 deputados, segundo os primeiros resultados. Com isso, Keir Starmer, líder dos trabalhistas, assumiu o cargo.

Os conservadores vinham dominando a política britânica desde 2010, mas com sucessivas substituições no cargo de primeiro-ministro (foram cinco desde então).

De acordo com analistas, o acúmulo de desgastes enfrentado pelos conservadores em 14 anos no poder fez com que o partido perdesse apoio.

Confira alguns dos motivos que levaram à derrota dos conservadores no Reino Unido:

Escândalos e crises

Os premiês conservadores enfrentaram uma sucessão de crises e desafios que enfraqueceram sua imagem, segundo Daniel Devine, cientista político da Universidade de Southampton.

Primeiro, o Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia. Ele foi aprovado em referendo em 2016, no governo de David Cameron, e implementado em 2020, depois de muitas discussões e rachas dentro do próprio partido.

A dificuldade em fazer vigorar o Brexit levou à renúncia da primeira-ministra que sucedeu a Cameron, Theresa May, e Boris Johnson assumiu o cargo de premiê com essa incumbência.

Mas o mandato dele foi marcado pela crise da pandemia de covid – e, na mesma época, pelo escândalo do Partygate – de festas realizadas em Downing Street, que é a sede do governo, bem na época do período mais rígido de lockdown no Reino Unido.

As revelações fizeram com que vários membros do Parlamento protocolassem pedidos para uma moção de desconfiança contra Johnson.

E, depois, vieram os problemas na economia, que chegaram ao auge no breve governo de Liz Truss, quando ela lançou um pacote econômico que causou alvoroço no mercado financeiro e alimentou a inflação e os preços de hipotecas.

“O grande ponto de virada para os conservadores foi o escândalo do Partygate, que derrubou Boris Johnson”, diz Devine.

“O segundo grande choque foi o plano orçamentário de Liz Truss. Ela ficou pouquíssimo tempo no poder, mas o resultado direto do seu projeto foi a disparada das hipotecas e da inflação.”

Economia

A economia é o maior problema enfrentado pelo Reino Unido atualmente, segundo a própria população.

Uma pesquisa recente da consultoria YouGov mostrou que 52% dos britânicos entrevistados colocam a questão acima de outros temas, como saúde pública, segurança ou imigração.

E muitos analistas acreditam que a vantagem dos trabalhistas na eleição teve menos a ver com uma adesão do eleitor aos projetos do partido, e mais com a insatisfação perante o custo de vida.

Assim como em outros países do mundo, a pandemia atingiu fortemente a economia britânica, aumentou o custo de vida e fez disparar as taxas de pobreza.

No final de 2022, a inflação chegou ao ponto mais alto em quatro décadas, passando dos dois dígitos e superando em muito a meta de 2% ao ano da época. Por trás disso estavam problemas globais e nacionais.

No âmbito mundial, aquele foi o momento em que a inflação no mundo inteiro era pressionada pela guerra na Ucrânia, que entre outros impactos fez os custos de energia subirem em toda a Europa.

E no âmbito nacional, o Reino Unido vivia uma conjunção difícil de fatores, alguns que persistem até hoje.

Primeiro, entidades como a Câmara de Comércio Britânico afirmam que persiste no Reino Unido uma escassez de mão de obra que afeta vários setores da economia. Com menos gente para trabalhar, os custos de produção sobem, e os preços sobem junto.

Essa escassez ainda está sendo estudada por economistas e tem múltiplas causas, mas uma delas é bastante conhecida: o Brexit, que fez muitos trabalhadores da União Europeia serem impedidos de permanecer no Reino Unido.

Críticos dizem que o Brexit também tem feito a economia britânica desacelerar nos últimos anos, por ter erguido barreiras para empresas britânicas que comercializam com a Europa, ou para empresas estrangeiras que usam o Reino Unido como sua base europeia.

O plano orçamentário lançado em setembro de 2022 pela então premiê Liz Truss só completou o cenário ruim.

Mas mesmo após a saída de Truss em 2022, a instabilidade continuou: 2023 foi um ano turbulento na economia britânica, com empobrecimento de boa parte da população e ondas de greves em vários setores.

O Reino Unido entrou oficialmente em recessão em 2023, um reflexo da situação já vivenciada por muitos cidadãos em seu dia a dia.

Imigração

Os conservadores também vinham enfrentando críticas referentes a outras políticas de seu governo, em especial restrições orçamentárias ao NHS, o sistema de saúde pública, e suas decisões sobre imigração.

Quando o tema é imigração, a discussão gira principalmente em torno de um plano do governo conservador para mandar imigrantes irregulares para Ruanda.

Essa seria uma solução para lidar com os migrantes que tentam entrar no Reino Unido cruzando o Canal da Mancha em pequenas embarcações.

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