Quarta-feira, 25 de dezembro de 2024
Por Redação O Sul | 25 de dezembro de 2024
A defesa de Fantinel alegou que a fala do acusado estaria abarcada pela imunidade parlamentar
Foto: Bianca Prezzi/Câmara de CaxiasA 5ª Vara Federal de Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, condenou o vereador Sandro Fantinel (PL) a três anos de prisão, à perda do cargo público e ao pagamento de R$ 50 mil de indenização pelo crime de induzir e incitar a discriminação e o preconceito contra o povo baiano. A sentença, proferida pelo juiz federal substituto Julio Cesar Souza dos Santos, foi divulgada nesta semana.
De acordo com o MPF (Ministério Público Federal), o vereador teria gerado humilhação, constrangimento e vergonha ao povo nordestino ao proferir discurso na Câmara de Vereadores, durante sessão ordinária, com transmissão ao vivo pela TV Câmara (canal próprio com alcance mundial na internet pelo Youtube), bem como no site camaracaxias.rs.gov.br, tendo alcançado grande repercussão também nas redes sociais.
Segundo a denúncia do MPF, o vereador sugeriu contratar argentinos, em detrimento daqueles a quem se referiu como “aquela gente lá de cima ”, além de afirmar sobre os baianos que a “única cultura que eles têm é viver na praia tocando tambor”. Fantinel também disse: “Deixem de lado aquele povo que é acostumado com carnaval e festa para vocês não se incomodar”.
A defesa argumentou que haveria excesso de acusação. Alegou também que a fala do acusado estaria abarcada pela imunidade parlamentar e que ele se dirigiu a seus eleitores agricultores, produtores e empresas agrícolas para agradá-los. Defendeu que não haveria dolo, uma vez que a intenção do réu não foi a de ofender, sendo pessoa de pouca instrução e que não dominaria o uso de figuras de linguagem.
Por fim, salientou que o vereador se retratou e se desculpou pelo ocorrido e, ainda assim, sofreu um massacre digital e social e foi alvo de ameaças.
Preliminarmente, o juiz Julio Cesar dos Santos afastou a tese de imunidade parlamentar, explicando que já consta em decisão do STF (Supremo Tribunal Federal) que a imunidade prevista na Constituição Federal se limita à circunscrição do município. Entretanto, no caso, as declarações tiveram grande repercussão nacional. Além disso, as afirmações não tinham nenhuma relação com projeto de lei ou função parlamentar, tendo sido “lançadas na forma de discurso avulso, eivado de conteúdo discriminatório.
Ao analisar o mérito, Santos concluiu que o parlamentar estava incitando diretamente a diferença de tratamento em razão da procedência nacional, afirmando que agricultores e empresas agrícolas gaúchas deixassem de contratar trabalhadores provenientes da região Nordeste do Brasil, notadamente do Estado da Bahia. A contraposição entre argentinos (limpos, trabalhadores e corretos, segundo o réu) e baianos (por consequência, sujos, preguiçosos e incorretos) teria o nítido intuito de menosprezar as pessoas nascidas naquela região.
Além da discriminação em razão da procedência nacional, o magistrado observou que o réu também incitou a discriminação de religião e raça ao falar que “a única cultura que eles tem é viver na praia tocando tambor”. “O tambor é um símbolo da diáspora negra no Brasil e tem papel sagrado no exercício de religiões de matriz africana” explicou.
O magistrado reconheceu a ocorrência de discriminação múltipla, pois a fala do acusado seria “dolosamente dirigida para induzir e incitar a discriminação e o preconceito em razão da procedência nacional, da raça e da religião”.
A pena de três anos e 20 dias de reclusão, em regime inicial aberto, foi substituída por duas penas restritivas de prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária de 30 salários mínimos, mais 86 dias-multa. Também foi decretada a perda do cargo público e fixada em R$ 50 mil a indenização pelos danos morais coletivos.
Cabe recurso ao TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região). A defesa de Fantinel informou que recorrerá da decisão.
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