Quarta-feira, 15 de janeiro de 2025
Por Redação O Sul | 7 de maio de 2015
É com a voz calma que Israel Leite da Silva, 48 anos, atesta: “Agora eu sou defunto” – e segue contando a inacreditável história do equívoco de sua morte. Em janeiro, o eletricista estava trabalhando havia dois meses em um hotel em Angra dos Reis (RJ), quando sua ex-mulher reconheceu o corpo de um homem brutalmente assassinado, com dez tiros no rosto, como sendo de Silva, que acabou sendo declarado oficialmente morto. Recentemente, no entanto, o carioca voltou às ruas do bairro em que morava, sem saber de nada, para espanto da família, amigos e vizinhos.
“Morri em janeiro e descobri agora”, diz.
Toda a confusão começou quando um cadáver desfigurado apareceu perto da casa de Silva. Os vizinhos acharam o corpo parecido com o do eletricista, e a ex-mulher foi chamada para reconhecê-lo no Instituto Médico Legal. Lá, afirmou que aquele era Silva, o homem com quem viveu por 17 anos e teve quatro filhos (dois pares de gêmeos).
Curioso ainda é que essa não é a primeira vez que a morte ronda Silva. Em 1987, uma fatalidade o deixou com sequelas físicas. Naquele ano, o eletricista perdeu um dedo da mão direita após tomar um choque em uma rede de alta tensão e despencar de um poste de 17 metros de altura.
“Como é que ela [a ex-mulher, ao reconhecer o corpo] não viu a mão? Não é possível que o morto também tivesse um dedo a menos”, disse Silva, irritado por ela tê-lo confundindo com outro homem.
Logo após o enterro do homem identificado como Silva, a ex-mulher, segundo o relato de vizinhos, vendeu os móveis do eletricista e deixou a casa com as crianças. Silva não tem notícias dela. Imagina que esteja no Paraná ou no Recife. A suspeita do eletricista é que ela tenha ficado assustada com a morte brutal daquele que seria seu ex e resolveu sumir. Antes, segundo Silva, ela teria recebido 25 mil reais do seguro de vida dele.
“Eu ligava toda semana para falar com os meus filhos. Em janeiro, não consegui mais falar e fiquei preocupado. Acho que eles fugiram com medo.”
Vida mais dura.
A vida ficou mais dura para Silva após descobrir que, oficialmente, está morto. No hotel onde trabalhava, ele não precisava usar o banco. Fazia as refeições no local de trabalho e recebia parte do salário em dinheiro. Por isso, não sabia que sua conta bancária estava bloqueada. A descoberta só se deu quando espantou a vizinhança ao surgir perto da casa onde morava. “Até hoje tem gente com medo no bairro”, conta uma amiga de Silva, Maria das Dores da Silva, 77 anos.
A advogada Maria de Fátima Caldas diz que o caso de Silva é de Justiça. Ele precisará buscar um defensor público e entrar com um processo para provar que está vivo. Enquanto isso, o eletricista mora dentro do carro de um antigo vizinho. E ainda acumula dívidas do tempo de defunto.
“Ele me deve 1,2 mil reais pelos meses em que estava morto. Já que ele está vivo, tem que pagar”, conta Hélio Costa, dono da quitinete em que Silva morava antes de partir para Angra dos Reis. “Morrer está me dando um trabalho que você nem imagina”, resume Silva. (Bruno Alfano/AG)