Entre as mudanças propostas na reforma do Código Civil debatida pelo Congresso Nacional está a possibilidade de expulsão do chamado “condômino antissocial”, aquele que torna a convivência com os demais moradores impossível. Isso pode acontecer, por exemplo, com o morador que faz barulho em horários inadequados, destrói a propriedade comum ou cria animais não-domésticos no seu apartamento.
No mês passado, ganhou notoriedade o caso do ex-jogador de futebol Carlos Alberto (com passagens por clubes como Corinthians, São Paulo, Vasco e Fluminense), alvo de uma ação judicial que pede a expulsão dele do condomínio em que mora na Barra da Tijuca, no Rio. O jogador é acusado pelos vizinhos de perturbação por música alta, insulto a porteiros, lançamento de garrafas, discussões e outros problemas. O ex-jogador nega as acusações de vizinhos e alega perseguição.
Atualmente, o artigo 1.337 do Código Civil traz algumas previsões para o morador antissocial. Por uma deliberação de três quartos dos demais condôminos, ele poderá de pagar uma multa de cinco vezes o valor do condomínio. Se o comportamento não cessar, o valor pode crescer para dez vezes essa quantia. Nesse sentido, a expulsão não está prevista diretamente no atual Código Civil.
Uma possibilidade é a de que a expulsão se baseie no Enunciado 508-CJF da V Jornada de Direito Civil, que justifica a exclusão do condômino antissocial se as multas forem ineficazes. No entanto, a falta de previsão legal pode fazer com que decisões pela expulsão, que já são consideradas excepcionais na jurisprudência, sejam derrubadas.
Primeiramente, o quórum de três quartos dos condôminos para determinar o pagamento de multas ao vizinho antissocial pode ser reduzido para dois terços dos presentes na assembleia. O ponto mais importante da alteração implica que, em caso de ineficácia da multa, a assembleia pode deliberar pela exclusão do antissocial, a ser efetivada mediante decisão judicial, proibindo seu acesso ao apartamento e às dependências do condomínio.
“Em caso de expulsão, o condômino não poderia viver mais no local, mas poderia emprestar ou alugar a unidade”, afirma Luciano Godoy, professor do departamento de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo.
De acordo com o especialista, o Código Civil hoje não basta para pacificar a questão da expulsão, com decisões apontando para os dois lados: o da exclusão e o das multas.
Em caso de expulsão, o condômino não poderia viver mais no local, mas poderia emprestar ou alugar a unidade
Para Eduardo Tomasevicius Filho, livre-docente em Direito Civil pela Universidade de São Paulo e pesquisador da área no âmbito das cidades, trata-se de uma chance para punir os condôminos antissociais de forma mais incisiva. “Ainda assim, pode haver, em um primeiro momento, um questionamento sobre a constitucionalidade dessa mudança, que poderá ser discutida”, sinaliza.
Mediação
Na confusão gerada por condôminos antissociais, o síndico pode possuir um papel fundamental. “Primeiramente, como mediador, buscando um diálogo e uma conciliação com o morador de comportamento nocivo. Caso não obtenha êxito, tomará as atitudes previstas no ordenamento para que a paz e a segurança sejam preservadas na comunidade”, declara Marcelo Borges, diretor de condomínio e locação da Associação Brasileira das Administradoras de Imóveis (Abadi).
O presidente da Associação Nacional de Síndicos e Gestores Condominiais, Vander Ferreira de Andrade, acrescenta que, caso a situação crítica se prorrogue sem que as sanções tenham surtido efeito pedagógico, cabe ao síndico levar o tema para a assembleia e propor a expulsão do condômino antissocial.
A síndica profissional Fernanda Chaves conta que, em 2019, foi convidada a cuidar de um condomínio em São Bernardo do Campo. Logo ela constatou que havia diversas irregularidades no local, desde um salão de beleza sendo alugado sem permissão até problemas com a contratação de segurança.
“Quando começamos a denunciar esses erros, eu e uma funcionária da administração passamos a sofrer ameaças de um grupo de cerca de dez moradores”, conta. Ela relembra que os trabalhadores da companhia liberavam pessoas que não eram moradores para entrar no condomínio e utilizarem o salão, o que não deveria ser permitido, mas era do interesse desse grupo.
As duas chegaram até mesmo a ser seguidas pelos moradores insatisfeitos. “Ao final, conseguimos tirar a empresa da gestão do local, mas foi bastante complicado”, comenta. Como resultado, os condôminos foram notificados. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.