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Voluntários dizem que foram enganados para pegar armas; eles contam que achavam que iam resgatar crianças

Mais de 3 mil armas de propriedade da fabricante Taurus foram retiradas do local. (Foto: Reprodução)

Voluntários que trabalham ajudando vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul afirmam ter sido enganados durante o resgate de um carregamento de armas no Aeroporto Internacional Salgado Filho, que está inundado pelas chuvas.

Na quinta-feira da semana passada, mais de 3 mil armas de propriedade da fabricante Taurus foram retiradas do local em uma operação com participação da empresa e coordenada por um grupo tático da Polícia Federal (PF).

Um grupo de voluntários que participou da mobilização, inclusive usando barcos para remover os artefatos de área alagada, porém, diz que foi acionado para participar de um resgate de crianças e que, somente perto do local, ficou sabendo que se tratava de transporte de armas. O episódio também foi relatado por testemunhas, com registro de fotos e vídeos da ação.

“A gente foi enganado. Não pela polícia, mas por um terceiro que se disse funcionário da Taurus. A gente foi de coração aberto para resgatar crianças, mas, chegando ao local, ficamos sabendo que era uma carga de pistolas e outras armas. A gente chegou logo de manhã e a operação acabou no pôr do sol”, afirma o programador Igor Garcia Cunha de Oliveira, de 26 anos.

O voluntário diz estar trabalhando em resgates desde o dia 4 de maio. Segundo ele, a PF não sabia que o grupo do qual fazia parte era formado por pessoas sem ligação com a empresa.

“No final da operação, expliquei a situação. Eles ficaram chocados porque achavam que a gente era uma equipe especializada da Taurus”, afirma Igor.

Em nota, a Taurus disse que não sabia da participação do grupo e que irá procurar informações sobre o ocorrido. “A empresa desconhece a participação de voluntários e vai levantar os fatos junto às autoridades policiais que participaram da operação”, diz a nota.

A empresa acrescenta que a operação de retirada das armas foi coordenada, na parte fluvial, pelo Comando de Operações Táticas da Polícia Federal (COT) e, na parte terrestre, com veículo de transportadora credenciada pelo Exército Brasileiro. Na segunda etapa, houve ainda escolta por dois veículos de segurança privada armados, além de três carros da Coordenadoria de Recursos Especiais (CORE) da Polícia Civil do Rio Grande do Sul.

No mesmo grupo, investidor Nicolas Vedovatto, de 26 anos, também alega que foi enganado. Ele conta como se deu a operação de resgate desde o início. O jovem explica que foi incluído em vários grupos de WhatsApp formados por pessoas que prestam ajuda aos desabrigados. Ele já estava empenhado e colaborando com ações humanitárias desde o início da tragédia. Na semana passada, porém, recebeu uma mensagem pedindo uma ajuda para aquela que seria sua “missão mais difícil”.

“Em um desses grupos, havia um pessoal que, em determinado momento, passou a informação que havia uma missão que era delicada, muito importante, que envolvia crianças. Foi então que reuni diversos materiais, como corda, boia, machadinha, pois não sabia com o que a gente ia se deparar. A gente queria saber onde era o local do resgate e não nos passaram, porque disseram que se divulgassem poderia tumultuar e que era uma operação sigilosa”, disse Vedovatto, morador de Capão da Canoa.

O investidor conta que ele e um grupo de voluntários combinaram de se encontrar em um posto de combustível onde, segundo ele, receberiam orientações. Os interlocutores, porém, se apresentaram como funcionários da Taurus.

“Disseram precisavam da gente, mas que não era mais para resgatar crianças e que a missão agora se tratava de armas. Então, nesse momento, toda nossa equipe ficou balançada, não queríamos ir”, explica.

O voluntário conta que, a essa altura, já tinha conseguido dois barcos para ajudar na operação, além de brinquedos para dar para as crianças quando elas fossem resgatadas.

“Levei brinquedos porque achei que podia ajudar, caso elas estivessem traumatizadas. Consegui, além dos barcos, um caminhão. Também mobilizei um barqueiro. Foi então que descobri que tudo seria usado para buscar armas. Mesmo a gente não querendo participar, eles nos persuadiram. Disseram que nossa causa era muito mais grave do que resgatar crianças, porque essas armas poderiam cair nas mãos de criminosos, e isso poderia ser muito pior”, disse.

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